o mar do poeta

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domingo, setembro 19

XINTOÍSMO

Xintoísmo (em japonês: 神道, transl. Shintō) é o nome dado à espiritualidade tradicional do Japão e dos japoneses, considerado também uma religião pelos estudiosos ocidentais.

A palavra Shinto ("Caminho dos Deuses") foi adotada do chinês escrito (神道), através da combinação de dois kanjis: "shin" (em japonês: 神, "shin"?), que significa "deuses" ou "espíritos" (originalmente da palavra chinesa shen); e "tō" (em japonês: 道, "tō"?), ou "do", que significa "estudo" ou "caminho filosófico" (originalmente da palavra chinesa tao).

Os termos yamato-kotoba (大和言葉) e Kami no michi costumam ser usados de maneira semelhante, e apresentam significados similares.



Torii no santuário de Itsukushima

O xintoísmo incorpora práticas espirituais derivadas de diversas tradições pré-históricas japonesas, locais e regionais, porém não surgiu como instituição religiosa formalmente centralizada até a chegada do budismo, confucionismo e daoísmo no país, a partir do século VI.

O budismo gradualmente se adaptou, no Japão, à espiritualidade nativa, como por exemplo na inclusão do kami, componente da crença xintoísta, entre os bodisatvas (bosatsu).

As práticas xintoístas foram registradas e codificadas pela primeira vez nos registros escritos históricos do Kojiki e Nihon Shoki, nos séculos VII e VIII.

Ainda assim, estes primeiros escritos japoneses não se referem a uma "religião xintoísta" unificada, mas a práticas associadas com as colheitas e outros eventos dos clãs relacionados às estações do ano, aliadas a uma cosmogonia e mitologia unicamente japonesas, que combina tradições espirituais dos clãs ascendentes do Japão arcaico, principalmente das culturas Yamato e Izumo.

O xintoísmo caracteriza-se pelo culto à natureza, aos ancestrais, pelo seu politeísmo e animismo, com uma forte ênfase na pureza espiritual, e que tem como uma de suas práticas honrar e celebrar a existência de Kami (em japonês: 神, Kami?), que pode ser definido como "espírito", "essência" ou "divindades", e é associado com múltiplos formatos compreendidos pelos fieis; em alguns casos apresentam uma forma humana, em outros animística, e em outros é associado com forças mais abstratas, "naturais", do mundo (montanhas, rios, relâmpago, vento, ondas, árvores, rochas).

Considerado como consistindo de energias e elementos "sagrados", o Kami e as pessoas não são separados, mas existem num mesmo mundo e partilham de sua complexidade interrelacionada.

O xintoísmo moderno apresenta uma autoridade teológica central, porém não tem uma teocracia única. Consiste, atualmente, de uma associação inclusiva de santuários locais, regionais e nacionais de variada significância, em importância e história, que exprimem suas diversas crenças através de práticas e idiomas semelhantes, adotando um estilo semelhante no vestuário, arquitetura e ritual, que data dos períodos Nara e Heian.

O xintoísmo tem actualmente cerca de 119 milhões de seguidores no Japão,embora qualquer pessoa que pratique algum tipo de ritual xintoísta seja contado como tal. Geralmente aceita-se que a ampla maioria do povo japonês participe de algum tipo de ritual xintoísta, ao mesmo tempo em que a maior parte também pratica o culto budista aos ancestrais.

No entanto, ao contrário de muitas das práticas religiosas monoteístas, o xintoísmo e o budismo tipicamente não exigem daqueles que lhes professam que sejam crentes ou praticantes, o que torna difícil contabilizar cifras exatas com base na auto-identificação com alguma crença, entre os habitantes do país.

 Devido à natureza sincrética das duas religiões, a maior parte dos eventos relacionadas à "vida" ficam a cargo dos rituais xintoístas, enquanto os eventos relacionados à "morte" ou à "vida após a morte" ficam a cargo dos rituais budistas (embora isto não seja uma regra); assim, é costumeiro, por exemplo, no Japão, registrar uma criança ou celebrar seu nascimento num santuário xintoísta, enquanto os preparativos para um funeral costumam ser ditados pela tradição budista.

Existem santuários xintoístas em diversos outros países, incluindo os Estados Unidos, Brasil, Canadá, Nova Zelândia, Austrália e Países Baixos, entre outros, e está em vias de expansão para se tornar uma religião global, especialmente com o surgimento de ramos internacionais dos santuários shinto.

História

Origens

O xintoísmo tem raízes muito antigas nas ilhas japonesas. Sua história registrada remonta ao Kojiki (712) e ao Nihon Shoki (720), porém os registros arqueológicos datam a um período significativamente mais antigo. Ambas as obras são compilações de tradições mitológicas orais já existentes.

O Kojiki estabelece a família imperial como o alicerce da cultura japonesa, na condição de descendentes de Amaterasu Omikami. Existe também uma genealogia de criação e aparição dos deuses, de acordo com um mito de criação. O Nihonshoki estava mais interessado em criar um sistema estrutural de governo, política externa, hierarquia religiosa e ordem social interna.

Existe um sistema interno de desenvolvimento histórico xintoísta que configura as relações entre o xintoísmo e outras práticas religiosas ao longo de sua história; os Kami ("espíritos") internos e externos.

O Kami interno ou ujigami (uji significa "clã") favorece a coesão e a continuação dos papeis e padrões estabelecidos; e o hitogami, ou Kami externo, traz inovação, novas crenças, novas mensagens e alguma instabilidade.

Os povos jomon do Japão utilizavam-se de habitações naturais, ainda não conheciam o cultivo de arroz, e frequentemente eram coletores-caçadores; a evidência física de suas práticas rituais é de difícil documentação.

Existem muitos locais que contêm estruturas rituais de pedra, e conhecem-se práticas funerárias refinadas, além dos antigos Torii, que indicam a continuidade do xintoísmo arcaico. Os jomon tinham um sistema tribal baseado em clãs, similar a muitos dos povos indígenas do mundo.

No contexto deste sistema, as crenças locais desenvolveram-se naturalmente, e quando a assimilação entre os clãs ocorreu, as crenças de tribos vizinhas acabaram por influenciar as outras. A um certo ponto passou a existir um reconhecimento de que os ancestrais criaram as gerações presentes, e a reverência aos ancestrais (tama) tomou forma.

Havia algum comércio entre os povos indígenas das ilhas japonesas e o continente, bem como diversas migrações, o que aumentou o crescimento e a complexidade da espiritualidade dos povos locais, através de sua exposição a novas crenças. Esta espiritualidade, no entanto, ainda era centrada no culto às forças naturais, ou mono, e aos elementos naturais dos quais todos dependiam.

A introdução gradual de organizações religiosas e governamentais metódicas a partir da Ásia continental, começada por volta de 300 a.C., plantou as sementes das mudanças reativas que ocorreriam no xintoísmo arcaico, ao longo dos 700 anos seguintes, em direção a um sistema mais formalizado.

Estas mudanças foram dirigidas internamente, pelos diversos clãs, frequentemente como forma de um evento cultural sincrético direcionado às influências externas. Eventualmente, à medida que os yamato conquistaram o poder, um processo de formalização se iniciou.

A gênese da casa imperial japonesa, e a criação subsequente do Kojiki, ajudou a facilitar a continuidade necessária para este desenvolvimento a longo prazo.

O xintoísmo apresenta hoje em dia um equilíbio entre as influências externas do budismo, do confucionismo, do taoísmo, das religiões abraâmicas, do hinduísmo e de crenças seculares que, embora tenha tido conflitos em seu desenvolvimento, aparenta atualmente ser natural e não-exclusivo.

Em períodos mais modernos o xintoísmo desenvolveu também novas formas e suas próprias subdivisões, e até mesmo expandiu-se para além das fronteiras do Japão, tornando-se uma religião global.

Xintoísmo e budismo

O Budismo foi introduzido no século VI e trouxe graves consequências para o Xintoísmo. Vindo da Coreia, apresentado ao imperador, o Budismo, apesar de algumas resistências iniciais, acabou por triunfar, tendo servido para a consolidação do poder imperial, com o apoio dos governantes locais.

Apesar disto, a tendência geral, e mais conforme à mentalidade do Oriente, foi a de fundir as duas religiões, mas sob a égide do Budismo.

Durante longos séculos, o Budismo impôs a sua influência, sobrepondo-se à religião tradicional, que porém não desapareceu.

Face ao domínio duma religião estrangeira desde logo vários pensadores e sacerdotes procuraram manter a dignidade e o papel desempenhado pela religião tradicional.

Na Idade Média, vários destes pensadores fizeram uma união entre os dois tipos de divindades, mas em sentido contrário ao já referido: os budas eram na verdade kami encarnados, que assim deixavam o seu estado original para descerem à terra.

Nos sécs. XVI-XVII, viveu-se um momento de renascimento da cultura japonesa, com o consequente afastamento de influências estrangeiras. Apesar de o Budismo não perder substancialmente o seu terreno, ficou agora relegado para segundo plano, a favor de uma tendência nacionalista que se afirmava, e que atingiria o seu ponto culminante no período seguinte.

No âmbito da ideologia profundamente nacionalista da era Meiji, a escolha duma religião oficial recaiu naturalmente sobre o Xintoísmo, já antes aclamado como a religião verdadeiramente original do povo japonês, considerado pelo regime como superior a todos os outros.

Criou-se então o chamado Xintoísmo de Estado, uma espécie de sacralização do Estado, ou melhor, laicização do Xintoísmo. De facto, o xintoísmo foi despido do seu carácter religioso para se tornar um dever cívico de reverência ao Estado e ao imperador.

O xintoísmo estatal permaneceu em vigor durante algumas décadas. Como expressão do nacionalismo japonês, exacerbou-se particularmente por ocasião da Segunda Guerra Mundial. Com a derrota do Japão, precipitou-se o seu processo de queda.

Em 1946, foi proclamada a nova Constituição, pela qual o imperador foi destituído de todas as prerrogativas divinas e de todo o poder político, tornando-se apenas símbolo da unidade nacional.

Terminologia

No princípio, esta religião étnica não tinha nome, mas quando se introduziu o budismo no Japão durante o século VI, um dos nomes que este recebeu foi Butsudo, que significa "o caminho do Buda".

Assim, a fim de diferenciar do budismo, a religião nativa passou a ser chamada xinto, palavra de origem chinesa, que combina dois caracteres chineses (kanji): "shin" (em japonês: 神, "shin"?), significando deuses ou espíritos (quando lido sozinho é pronunciado "kami") e "tō" (em japonês: 道, "tō"?), que significa caminho filosófico.

Assim, xinto significa "o caminho dos deuses". O nome chinês foi escolhido porque na época apenas o chinês era escrito no Japão, já que não haviam desenvolvido ainda a escrita japonesa.

Tipos de xintoísmo

Reconhecem-se várias expressões do xintoísmo, que são o resultado da evolução histórica da religião, lugar da sua manifestação e prática religiosa dos adeptos.

Xintoísmo dos santuários: é o conjunto de crenças que se exprimem através das festas e das venerações nos santuários. Praticamente todos os santuários pertencem à Associação dos Santuários (Jinja honchó), fundada em Tóquio no ano de 1946.

Xintoísmo doméstico: exprime-se nos lares japoneses. Nas casas xintoístas existe em geral um pequeno altar consagrado aos deuses, o kamidana. Em cima deste altar encontra-se muitas vezes um amuleto oriundo do santuário local, do Grande Santuário de Ise e em alguns casos. Nestes altares colocam-se oferendas (saquê, arroz, sal) e recitam-se orações.

Xintoísmo imperial: é o resultado do desenvolvimento na casa imperial da prática dos ritos e cerimónias do xintoísmo.

Xintoísmo popular: caracteriza-se pela ausência de uma sistematização doutrinária e de uma organização. É o tipo de xintoísmo praticado essencialmente pelo indivíduo.

Xintoísmo das seitas: é composto essencialmente pelas treze seitas reconhecidas pelo Estado dos Meiji entre 1876 e 1908. Estas seitas possuem em geral um fundador (homem ou mulher).

Até ao fim da Segunda Guerra Mundial, os grupos xintoístas que não pertenciam a uma das treze seitas não eram reconhecidos pelo Estado, o que gerou a integração de muitos desses grupos numa das seitas existentes. Depois da guerra, e tendo sido declarada a liberdade religiosa, alguns grupos estabeleceram-se como organizações independentes.

Escrituras sagradas

O xintoísmo não possui um livro sagrado, como a Bíblia ou o Alcorão. Há no entanto um conjunto de textos sobre os ensinamentos da religião que recebem o nome de Shinten, "escrituras sagradas", mas não são considerados textos revelados ou de carácter sobrenatural.

Kojiki ("Anais das coisas antigas"): datado de 712, é o texto sagrado mais antigo, sendo composto por três volumes.

Nihonshoki ("Crônicas do Japão"): foi redigido em 720 em chinês em 30 volumes. Também conhecido como Nihongi.

Kogo-shui: compilação das tradições do clã dos Imbe, uma família que junto com a família dos Nakatomi era responsável pelos ritos. A sua redacção foi concluída em 807.

Estes livros apresentam as narrativas míticas da tradição xintoísta. Os mitos descritos referem-se a um caos primordial em que os elementos se mesclam em massa amorfa e indistinta, "como num ovo". Os deuses surgiram desse caos.

Crenças do Xintoísmo

 Kami

O xintoísmo baseia-se no culto aos kami (神). Esta palavra é frequentemente traduzida por "deus" ou "divindade", o que não traduz completamente o conceito, dado que os kami pode ser também forças vitais ou espíritos da natureza. Ao contrário dos deuses das outras religiões, os kami não são onipotentes ou oniscientes, possuindo poderes limitados.

 Nem todos kami são bons. Alguns kami são locais ou conhecidos como espíritos de um local em particular ou a lugares (montanhas, ervas, árvores, vales, rios, mares, encruzilhadas. Outros representam elementos ou processos da natureza, como por exemplo, Amaterasu, a deusa do Sol, Tsukiyomi, deus da lua, Susanoo, deus da tempestade.

Existem kami ligados a fenómenos meteorológicos (chuva, vento (Fujin), trovão...), e kamis associados à vida humana (vestuário, transportes, ofícios, etc.).

Incluem-se ainda no conceito de kami os espíritos de homens notáveis, como de certos guerreiros. Os espíritos dos antepassados também são considerados deuses tutelares da família ou do país, motivo pelo qual os ritos fúnebres possuem grande relevo.

Os textos xintoístas referem-se a "oitocentas miríades" de kami (yaoyorozu no kami); este número não deve ser interpretado literalmente, pretendendo-se apenas transmitir a noção de que existem inúmeros kami. Os kami não são perceptíveis pelo ser humano.

Podem ser divididos em dois tipos: os que habitam no céu (amatsukami) e os que habitam na terra (kunitsukami). Os primeiros trazem à terra influências positivas, enquanto que os segundos mantêm-na como ela.

O kami mais eminente é a deusa-sol Amaterasu O-mikami, antepassada da família real japonesa. O seu santuário principal é o Grande Santuário de Ise.

Cosmologia xintoísta

Em relação à estrutura do mundo, existem duas concepções diferentes, que se cruzam e se tomam muitas vezes em paralelo, sem se contradizerem, pois representam duas perspectivas diferentes e complementares.

A primeira delas é vertical e fala de três mundos distintos: a “Alta Planície Celeste”, morada dos kami do céu, de onde eles descem, para dar paz, ordem e felicidade.

É um mundo descrito como reflexo do mundo dos humanos, uma espécie de Japão plenamente belo e perfeito; segue-se o “País do Meio da Planície dos Canaviais”, morada dos homens, onde os kami desceram; por último, o chamado “País de Yomi”, subterrâneo, moradia dos mortos, terra de máculas e de pecados, onde habitam os espíritos malignos que influenciam o homem para o mal. Esta tradição é a principal da mitologia xintoísta e reflecte os meios aristocráticos.

A segunda concepção é horizontal, e coloca lado a lado o “País do Meio” e o chamado “País dos Mortos” que, ao contrário do que o nome indica, é uma terra de delícias, situada para além dos mares, onde habitam os espíritos purificados dos antepassados, que visitam este mundo, trazendo felicidade e protecção aos viventes.

Esta concepção é de cariz mais popular. Há que notar, mais uma vez, que o Xintoísmo atribui a importância fundamental a este mundo. De facto, tanto kami como antepassados, embora habitem noutros planos, conservam estreitas relações com o mundo dos humanos.

É claro que estas concepções devem ser lidas, não de modo físico, sob o qual se tornariam ultrapassadas, mas de modo metafísico, como na religião cristã.

A natureza

Há que reconhecer que o homem vive graças à natureza, a tudo quanto ela lhe fornece, pelo que a sua atitude deve ser de profunda gratidão e reverência. Mesmo quando a natureza se desenfreia, o ser humano é forçado a reconhecer que muito maiores são os benefícios que dela recebe. O homem, apesar de todo o seu avanço tecnológico, não possui poder pleno, e deve reconhecer a sua humildade, num espírito de coexistência pacífica.

Há inúmeras divindades ligadas a elementos naturais, o que atesta que tudo é governado pelos kami. Logo, a natureza reveste um carácter sagrado, regendo-se por uma vontade e sensibilidade próprias, por uma espiritualidade misteriosa, mais do que propriamente por leis naturais.

Sendo que toda a natureza descende de "kamis" assim como a humanidade, fica claro que tudo está interligado tendo como origem em comum um ancestral divino. Assim sendo o ser humano e a natureza, seus elementos, minerais, vegetais e animais, são parentes.

A vida dessassociada da natureza é incompatível com o Xintô, o ser humano não deve combatê-la ou transformá-la sem necessidade vital. É comum aos praticantes xintoístas o retiro para ambientes onde possam promover a integração com a natureza, uma forma de purificação, elevação espiritual, e oportunidade para reflexão e meditação.

Como já foi dito na introdução, o Xintô e a própria cultura japonesa pregam que sendo a natureza sagrada, sua destruição é indesejável, e não existe o sentimento de hostilidade inerente recíproca imperante no ocidente.

Outra prática bastante disseminada é a deificação de determinados elementos naturais em especial. Como por exemplo a árvore que representa um família ou um rocha que ocupa lugar de destaque em determinada cidade. Principalmente na antiguidade, era tradicional em muitas aldeias a veneração de algum "ícone" que representasse bem seu povoado ou dinastia.

O comportamento xintoísta é tão avesso a interferência no cenário natural, para ele é sagrado e perfeito, que qualquer atividade que implique em utilização ostensiva dos recursos naturais deve ser recompensada no mínimo com a construção de um templo dedicado a natureza.

As Montanhas

As montanhas no Japão são muito numerosas e estão envolvidas nos aspectos da vida diária, é delas que brotam os rios, e são consideradas sagradas. Não são kami em si, mas sim moradias de kami. O território montanhoso é tão respeitado que mesmo hoje em dia, o alpinismo não é uma atividade muito difundida pelo povo japonês, e isso num país onde é difícil ver todo um horizonte livre da presença de montanhas.

É muito comum a contrução de templos nessas regiões, assim como cerimônias de deificação e requisição de boas colheitas à "deusa do arrozal" que vive nas montanhas. Nas lendas japonesas as montanhas ocupam lugar de destaque na associação com grandes desafios, buscas e peregrinações.

Moral do Xintoísmo

Como vimos, o homem é considerado como naturalmente bom e puro, participante da natureza dos kami, e que o pecado e a impureza se devem a influências malignas dos espíritos habitantes do mundo inferior. Por isso, o homem recebe directamente dos kami uma componente natural, um ideal celeste a ser realizado nesta vida, modelo de vivência dado e aceite como meta, e que representa a ligação da vida humana à vida divina.

Este é o maior conceito moral do Xintoísmo, o chamado michi, termo que significa “caminho”. Trata-se de um ideal de justiça e de carácter, de que ninguém se deve afastar, elemento básico da vida xintoísta e do próprio culto. O michi, obediência ao curso da natureza, reveste-se duma extrema simplicidade e naturalidade.

Para o Xintoísmo, a vida só alcança o seu sentido e a sua finalidade se for vivida na pureza, que é o seu estado natural. A vida que não leva isto em conta é radicalmente antixintoísta e não agrada aos kami que, desgostosos, podem mandar vários tipos de desgraças para avisar o pecador, e até mesmo castigá-lo.

Procura-se esse ideal de pureza, tanto corporal como mental e espiritual, que leva o homem à sua plenitude. Embora o homem não possa controlar tudo o que acontece e pode danificar a sua pureza, tem a responsabilidade de procurar viver uma vida autenticamente xintoísta, recta, clara e honesta, segundo a vontade dos kami.

Vítima de forças que lhe escapam, o homem corrompido é alguém que deixou de pertencer, durante algum tempo, ao mundo da bondade e da felicidade, possuindo, porém, o direito de voltar a ele. Por isso, o pecado e a falta moral, embora reconhecidos, revestem um carácter diferente do que têm para os ocidentais.

Aquilo que pode danificar a pureza pode ser de carácter voluntário ou involuntário. As faltas voluntárias são verdadeiros pecados, da responsabilidade daquele que os pratica, e denominam-se tsumi. As faltas involuntárias não fazem, obviamente, a pessoa incorrer em igual responsabilidade, embora ela possa ter contribuído para a situação, devido à sua má conduta ou imprudência. Incluem-se neste grupo as calamidades ou desgraças (wazawai) e as manchas, impurezas (kegari), adquiridas por contactos com elementos como a cadáver, o sangue, as relações carnais, etc.

Estes males, como vimos, têm origem no mundo inferior, que envia as calamidades e impurezas e incita aos crimes. Para afastar a sua nefasta influência, realizam-se vários tipos de exorcismos.

Isto, que parece uma confusão entre mal moral e acontecimentos fortuitos, tem a sua justificação no preceito fundamental da pureza que, para muitos pensadores xintoístas, se sobrepõe aos ritos e ao culto.

Tudo isto é a concepção geral acerca da moralidade. No que se refere ao concreto, as concepções morais rigidos do Xintoísmo apresentam bastante pobreza, pois não se encontram códigos morais definidos propriamente ditos, como existem noutras religiões orientais, como o confucionismo, por exemplo.

O michi apresenta-se como algo extremamente vago e simples, o que pode levar a pensar que o Xintoísmo rejeita propositadamente qualquer tipo de regras concretas de moral.

Mas, a este respeito, um grande teólogo xintoísta, Motoori (1730-1801), apresenta uma teoria interessante. Diz ele que os homens foram naturalmente dotados pelos kami de conhecimento do que devem ou não fazer, pelo que não precisam de códigos morais.

Se necessitassem de tal coisa, seriam inferiores aos animais que, embora em grau inferior, sabem como devem proceder. A ausência deliberada dum código moral no Xintoísmo é, para Motoori, motivo de orgulho, pois significa que aos japoneses basta-lhes seguirem a moral do coração e do espírito puro, neles inscrita pelos kami. Os chineses e outros, por exemplo, com as suas abundantes teorias morais, só mostravam que eram, na verdade, pessoas perversas e depravadas.

Culto

Finalidade do culto xintoísta

As práticas do Xintoísmo têm a finalidade de se dirigirem aos kami, para que escutem a oração dos fiéis.

As orações podem ter diversos sentidos: pedidos, muitas vezes relacionados com a vida do dia-a-dia ou com alguma ocasião importante; acções de graças, por um benefício concedido, uma meta atingida, um obstáculo ultrapassado; promessas de acção futura em favor dos homens e da sociedade; tentativas de aplacar a fúria dos kami, irritados por alguma coisa; ou, muito simplesmente, para os louvar, rendendo-lhes homenagem sincera, sem esperar propriamente nada de especial em troca.

Através de vários elementos, os fiéis podem estabelecer relação com os kami, relação muitas vezes de carácter filial, em que uma divindade é tutelar de dada região ou localidade. Os “paroquianos” estabelecem especial ligação com esse kami, que os atende e protege, nos mais variados acontecimentos da sua vida.

Organização sacerdotal

Os santuários têm ao seu serviço um número variável de sacerdotes, que neles oficiam de vários modos. São designados pelo termo kannushi, que significa “pessoa que pertence ao kami”, ou então pelo termo chinês shinkoki, “pessoa cuja profissão é servir a divindade”.

A sua principal função é a de servir e adorar os kami e servir como um elo entre eles e os crentes através da execução dos ritos nos santuários, visando assegurar a proteção do povo japonês e do imperador.

Não costumam falar em público, tendo sido mesmo proibidos disso em 1885, no contexto do Xintoísmo de Estado. Hoje em dia, porém, os sacerdotes pregadores começam a ser apreciados. Não são considerados como chefes ou guias espirituais, mas somente como oficiantes de atos de culto, a pedido dos fiéis e em seu benefício.

O sacerdócio xintoísta é aberto às mulheres. As sacerdotisas têm mesmo tendência a aumentar, encontrando-se algumas à frente de grandes templos. O sacerdócio feminino desenvolveu-se no Japão após a Segunda Guerra Mundial. Para além de sacerdotisas, as mulheres podem ainda ser mikos.

Uma miko é uma virgem que leva uma vida monástica, ajudando os sacerdotes a executar os ritos nos templos e executando as danças sagradas. Exercem estas funções durante cinco a dez anos.

Os sacerdotes repartem-se por várias categorias. A mais elevada é a de Princesa consagrada ao kami, uma princesa virgem da família imperial. Atualmente, só existe uma, no santuário de Ise. Em seguida, temos o Grande Sacerdote, à frente de cada santuário, e depois o restante clero, que se reparte por funções diferenciadas.

Hoje em dia, verifica-se uma nova preocupação em revitalizar o Xintoísmo e os santuários, buscando novas tendências, pelo que se tem agora grande cuidado com a preparação intelectual e teológica dos candidatos a sacerdotes.

 Os regulamentos actuais prevêem vários diplomas possíveis, dos quais pelo menos um é exigido aos sacerdotes, que apenas o obtêm após vários anos de estudo em universidades ou institutos especiais. Hoje em dia a formação de um sacerdote xintoísta é garantida pela frequência de um curso na Universidade de Kokugakuim ou da Universidade de Kogakkan.

Os sacerdotes, uma vez consagrados, mantêm as suas funções habitualmente toda a vida, mesmo não sendo obrigados a exercê-las. Moram fora do santuário, com exceção do Grande Sacerdote. Os sacerdotes xintoístas não são obrigados a levar uma vida de castidade, podendo casar e fundar uma família, o que geralmente fazem.

As vestes sacerdotais apresentam grande beleza artística, de raízes nos séculos passados, mas só são utilizadas nos santuários e em ocasiões especiais na rua. A indumentária para o culto fica completa com um toucado especial e sapatos próprios. Sobre a testa de um "Yamabushi", coloca-se uma pequena caixa preta chamada "tokin", que é amarrada à sua cabeça com um cordão preto.

Durante as cerimónias, os sacerdotes costumam trazer também uma espécie de ceptro de madeira, que tem um significado purificador, mas sobre o qual não recai qualquer tipo de veneração.

Fora das funções rituais, os sacerdotes não usam qualquer tipo de sinal exterior, que os distinga dos leigos.

Os santuários



Os santuários xintoístas espalham-se por todo o Japão, constituindo lugares privilegiados de culto. Mas, embora surjam por todo o lado, têm geralmente alguma razão especial para existir: um fenómeno natural, um acontecimento histórico ou mítico, a simples devoção pessoal ou o patronato político.

Também os há motivados por revelações em sonhos, ou porque simplesmente era necessário um lugar de culto naquele local.

Quando o local de construção de um novo santuário é escolhido, põe-se em prática uma série de ritos, destinados a purificar o lugar e a invocar a presença do kami, para que se digne vir habitar naquele sítio.

Se mais tarde for decidido deixar aquele santuário ou mudá-lo para outro lugar, existem os ritos inversos, pelos quais se convida delicadamente o kami a retirar-se.

O santuário encontra-se na base do Xintoísmo. É nesse local que a divindade habita e que escuta os seus fiéis, e é também centro de ligação da comunidade e de partilha de identidade. Neste contexto, podem distinguir-se três grandes tipos de santuários, conforme a abrangência que possuem:

os de dimensão local, centros de partilha de uma comunidade reduzida, onde se venera o kami da localidade. Este tipo de santuário congrega em torno de si as pessoas da aldeia, que sentem uma filiação comum em relação à divindade. O santuário aparece como local de estreitamento de relações entre kami e paroquianos.

santuários de tipo particular, mais abrangentes, procurados por motivos concretos e determinados, como o êxito nos negócios ou nos estudos, ou outro tipo de protecção especial. Este género de santuários encontra-se por todo o Japão.

por último, os grandes santuários nacionais, destino de peregrinação de milhões de pessoas, todos os anos, dos quais o mais importante é o de Ise, já referido, em honra da deusa Amaterasu, e que está directamente ligado à casa imperial.

Além destes, há ainda templos dedicados a kami de guerra, a valores marciais ou em honra de pessoas notáveis, a quem se pedem favores específicos.

O santuário é entendido como um local onde as pessoas se vêm “refrescar” espiritualmente. Neles, está-se em profunda comunhão com a natureza, que abre o homem a uma espiritualidade plena e à identificação pessoal com os kami.

Os templos xintoístas podem assumir as mais diversas formas e tamanhos, mas apresentam certos aspectos em comum. Todos eles são constituídos por um edifício, ou um conjunto deles, inseridos num espaço envolvente, rodeados pela natureza. Têm particular importância as árvores, principalmente a árvore sagrada, sakaki, utilizada em muitos dos rituais.

O espaço em volta do edifício principal é por vezes muito extenso, e apresenta-se dividido em várias partes. Ao longo do caminho, que nunca é em linha recta, encontra-se uma série de diferentes elementos separadores, que marcam também etapas duma caminhada espiritual. São eles:

os torii, muito característicos dos templos japoneses, que são uma espécie de portais sem porta, constituídos por dois postes verticais e duas traves horizontais. Aparece um de imediato no início do caminho e depois geralmente mais dois, ou mesmo uma grande fila deles. A série de torii repete-se para cada via de acesso ao santuário;

pontes, por vezes várias, até se chegar ao templo algumas monumentais e muito elaboradas. A água é um elemento purificador, pelo que os cursos de água debaixo das pontes constituem uma eficaz barreira contra toda a impureza;

barreiras e paliçadas, com portas, que simbolizam a entrada no local sagrado, reservado ao homem puro.

Encontram-se também jardins, lagos, lanternas. Ainda antes de se chegar ao edifício principal, depara-se um tanque de água limpa, geralmente abrigado por um alpendre, no qual os fiéis se lavam, purificando-se de todas as impurezas e pecados, servindo-se, para isso, dumas colheres compridas de bambu, para tirar a água.

É costume também, em ocasiões solenes, libertar aves, peixes e outros animais.

Chegamos, finalmente, ao edifício do templo. Pode haver vários, num mesmo santuário, dirigidos a diferentes kami. Têm geralmente dimensões modestas, não obstante a grande diversidade de tamanhos. São constituídos por três secções:

uma sala de orações (Haiden) para os fiéis, onde eles dirigem as suas preces ao kami. À entrada está uma grande caixa de madeira, para depositar moedas, e um sino, ligado a uma corda, que serve para advertir o kami da presença do fiel;

uma sala de oferendas, reservada aos sacerdotes (Heiden);

uma sala mais pequena (Honden), nunca visitada, considerada a morada física do kami, e onde podem estar depositados objectos simbólicos, como espelhos, jóias ou espadas, invólucros onde reside o espírito da divindade. O espelho, particularmente, é considerado morada privilegiada do espírito divino, e tem origem muito antiga, sendo já mencionado na mitologia japonesa.

Alguns templos prevêem nos seus estatutos serem totalmente reconstruídos periodicamente. É o caso do templo de Ise, reconstruído de vinte em vinte anos. Essa ocasião é rodeada de ritos próprios, para convidar o kami a mudar de residência. Embora reconstruídos, os templos mantêm o estilo do anterior, pelo que os novos não diferem dos antigos e originais.

Alguns santuários possuem também uma espécie de museu, não raras vezes repleto de peças de grande valor, consideradas espólio da divindade.

Os ritos exercidos nos santuários, apesar de muito diversos, apresentam o seguinte esquema: o sacerdote, depois de purificado, invoca o kami. Faz ofertas propiciatórias, de bebidas e alimentos, a que se segue a oferta de jogos, danças e representações, para entreter a divindade. No fim, o kami é convidado a retirar-se, seguindo-se uma refeição fraterna.

Ritos de purificação

A purificação é uma prática fundamental em toda a prática xintoísta. É por ela que o homem se liberta, regressando ao seu estado inicial de pureza, a que tem direito. Para a purificação, que antecede qualquer acto religioso, particular ou comunitário, utilizam-se diversos ritos, que assumem formas diferentes.

Os kami não suportam a impureza, pelo que se exerce sempre um conjunto de práticas purificativas antes do culto propriamente dito, que tornam puros os participantes, os objectos e as oferendas. Os ritos de purificação assumem três formas distintas:

o misogi, que consiste na purificação por meio da água. A água é tida como poderoso elemento purificador, crença já muito antiga, pois é referida na mitologia: o deus Izanagi, depois de fujir dos infernos, banhou-se na água dum rio, para se purificar das imundícies contraídas naquele lugar.

Ao banhar-se ou lavar-se na água, o fiel xintoísta obtém a purificação das impurezas, tanto das voluntárias como das involuntárias. Pela água, purifica-se o corpo e a alma. O misogi é depois estendido a níveis sucessivamente superiores: o coração, o meio envolvente, a alma;

o harai, que é um tipo de purificação algo próximo do exorcismo. É realizado por um sacerdote, que agita sobre o que deve ser purificado ramos da árvore sagrada, sakaki, ou uma vara com tiras de papel penduradas, ónusa e joga-se um punhado de sal. Por este meio, obtém-se a purificação de todas as manchas, corporais e espirituais, bem como o afastamento de todas as influências malignas.

Duas vezes por ano, no fim de Junho e de Dezembro, realiza-se uma purificação solene, ou grande exorcismo, o chamado o-harai.

No recinto do santuário, reúnem-se muitas pessoas, que recebem umas tiras de cânhamo ou de papel branco (kirinusa). Depois de recitar a oração de purificação, o sacerdote agita a vara com os papéis, enquanto as pessoas agitam também as suas tiras. Estas tornam-se objectos de substituição, contendo todas as impurezas, e são lançadas a rios ou ao mar.

Nalguns santuários, um exercício semelhante é feito com papéis recortados em forma humana (hitogata), que a pessoa passa pelo corpo, depois de neles ter escrito o nome;

o imi, que é um período de jejum a ser realizado antes das cerimónias. Tem duração diferente, conforme a importância do rito. Consiste em abster-se de determinados alimentos e bebidas, bem como de palavras e acções menos próprias.

É um período de recolhimento pessoal, evitando todo o tipo de impureza, sem se ouvir música e sem se preocupar com assuntos que causem fadiga ou sofrimento. Este tipo de purificação é principalmente realizado pelos sacerdotes, que se retiram para outro lugar e fazem abluções. Após este tempo, qualquer pessoa está apta a participar nas cerimónias mais importantes.

Culto individual




Templo xintoísta de Jyuniso.

Na sua vida diária, todo o fiel xintoísta tem a obrigação de prestar homenagem aos kami, o que pode ser feito nos mais variados lugares e ocasiões, desde a casa até ao templo passando pelo campo ou pela rua.

Revestem uma importância particular as visitas aos santuários, que podem ser realizadas com diferentes objectivos: prestar contas, louvar, agradecer ou rogar. Todos os fiéis têm como dever ir visitar periodicamente o kami e relatar-lhe o que lhe tem acontecido na vida diária, não no intuito de pedir perdão, mas para simples informação.

É comum também agradecer graças recebidas ou louvar simplesmente o kami. O pedido de graças faz-se geralmente em favor de outra pessoa ou da sociedade, pois considera-se de mau tom pedir para si próprio.

As orações também não devem ser muito longas, complexas, para não aborrecer o kami. Muitas vezes, são os sacerdotes os encarregados de transmitir as preces às divindades, devendo saber interpretar, por sinais diversos, se a oração foi ou não bem recebida.

A adivinhação é um rito que também acompanha frequentemente o rito individual: faz-se através de varetas numeradas, dentro duma caixa, que correspondem a predições e conselhos.

Põem-se em prática também uma série de rituais específicos, entre os quais o mais característico é o bater das palmas. Depois de reverências solenes, diante do templo do kami, o devoto bate várias vezes as palmas, finalizando de novo com reverências. Este gesto parece destinar-se a atrair a atenção da divindade, mas o seu sentido não se esgota simplesmente aí.

As ofertas feitas são geralmente de ramos de sakaki, a que se prendem tiras de papel.

Em sua casa, os fiéis têm geralmente um pequeno altar doméstico (kamidana), onde colocam vários amuletos: um do santuário local, outro do grande santuário nacional de Ise, e mais algum, conforme as devoções e preferências. Todas as manhãs, são feitas oferendas: saquê (aguardente de arroz), arroz, sal. Acende-se uma lamparina e fazem-se orações aos kami.

Um outro costume é o das peregrinações. Os japoneses apreciam peregrinar, ganhando méritos pela austeridade e pelas privações. Mas é claro que hoje em dia as viagens são muito mais confortáveis. É hábito ter um livrinho, onde se registam os emblemas dos vários santuários percorridos, assim como adquirir amuletos, que servem de recordações.

Festas

A religião xintoísta comemora um grande número de festas, com uma grande variedade de costumes e de motivos para celebrar. Não raramente, verifica-se um grande intercâmbio entre religião e estado civil: várias festividades xintoístas são feitas feriados, e vice-versa.

As festas dividem-se em dois grupos: as comunitárias, respeitantes à população em geral, e as particulares, de âmbito mais pessoal e familiar.

Diversos tipos de ritos festivos são celebrados nos santuários. Cotidianamente, fazem-se cerimónias de oferendas, de manhã. No primeiro dia de cada mês também há ritos próprios. Estes são ritos de dimensão modesta.

Reisai

Cada santuário, uma ou duas vezes por ano, celebra uma data festiva, relacionada com o kami ou com o seu templo. O dia em que é celebrada a festa pode ter múltiplos significados: pode corresponder ao dia de fundação do santuário, a um dia importante na sua história ou ser um dia associado à divindade do santuário.

Durante estas festas ocorre geralmente uma procissão dos kami, razão pela qual as festas são também chamadas de shinkó-sai ("Festa da Procissão dos Deuses") ou togyo-sai ("Festa da Augusta Travessia"). Os kami são instalados num carro (hóren) ou num palanquim (mikoshi) e são passeados pela aldeia ou cidade.

Junta-se muita gente, que agita ramos de árvore e estandartes, fazendo daquele acontecimento algo muito colorido e vistoso. Estabelecem-se locais de paragem, para o kami descansar.

A finalidade deste acto é simplesmente entreter e divertir a divindade, pedindo-lhe, ao mesmo tempo, que continue a dispensar a sua protecção. Estas festas são também ocasião para jogos, artes e danças, tendo especial significado para o estreitamento de laços entre kami e paroquianos, e destes entre si.

Festas da Primavera

São várias as festas da Primavera (haru matsuri). No dia 17 de Fevereiro desenrola-se a festa Toshigoi-matsuri no palácio imperial e em todos os santuários do Japão, durante a qual é feita uma prece que solicita boas colheitas e a prosperidade do país.

Xintoísmo e ciclo de vida

Os vários momentos da vida humana, muitas vezes ligados a ritos de passagem, são ocasião para realizar um tipo de festas de motivação mais pessoal, realizadas no seio da família. São ocasião de agradecimento, de pedido e de renovação de propósitos para com os kami.

Primeira apresentação no santuário

A primeira apresentação no santuário ou hatsumyia mairi consiste em levar ao santuário local os recém-nascidos para serem apresentados às divindades. No caso dos meninos a apresentação ocorre no trigésimo primeiro dia e nas meninas no trigésimo terceiro dia (embora possam ocorrer variantes locais quanto ao número de dias).

No passado era hábito a criança ser levada ao santuário pela avó, porque se considerava que a mãe estava impura por ter dado à luz, mas hoje em dia a criança é muitas vezes levada pela mãe.

Shichigosan

No dia 15 de Novembro as famílias deslocam-se aos santuários com os filhos para agradecer aos kami o fato destes gozarem de saúde e para orar pelo seu crescimento. As crianças que acompanham os pais são os meninos de três e cinco anos e as meninas de três e sete anos. O nome do festival deriva precisamente da idade das crianças: shichi(sete), go (cinco) e san (três).

Celebração da maturidade

A 15 de Janeiro celebra-se a festa da Idade Adulta (Seijin Shiki). Nesse dia os jovens com vinte anos reúnem-se nos santuários para receber uma bênção, embora a festa também possua um carácter estatal, com cerimónias nas prefeituras. A Constituição japonesa atribui a maioridade aos jovens que atingiram os vinte anos.

Outros momentos

votos por um parto fácil: no quinto mês, a mulher grávida coloca no ventre um cinto de tecido branco, purificado, para proteger o feto, e ora pela criança que vai nascer;

as festas chamadas de sekku, que para os meninos é no dia 5 de Abril, em que se estendem estandartes em forma de carpa, se fazem bonecos em figura de guerreiros e se oferecem bolos. Para as meninas, é no dia 3 de Março, em que se colocam bonecas sobre um estrado e se oferecem bebidas, doces e bolos;

a entrada na vida activa, que é ocasião para o jovem agradecer aos kami, comprometendo-se a dar o seu melhor para o serviço da sociedade;

o casamento, que é celebrado numa cerimónia muito solene, na presença de um sacerdote, que inclui oferendas, orações e promessas aos kami, seguindo-se um banquete;

a expulsão das maldições. Certas idades são consideradas nefastas, sujeitas a desgraças: 35, 42 e 61 anos para os homens e 19, 33 e 37 anos para as mulheres. Nessas alturas, um sacerdote realiza um exorcismo próprio e recomenda bastante prudência, pois as dificuldades ameaçam acumular-se;

as festas de longevidade: certos aniversários são comemorados com uma festa familiar e uma visita ao santuário. É o que se faz no 60º, 70º, 77º, 80º, 88º, 90º e 99º aniversários.

 Influências

A tradição religiosa do xintoísmo é anterior ao budismo, que posteriormente foi introduzido no Japão no século VI. O contato entre as duas religiões modificou ambas.

Os budistas adotaram divindades xintoístas, e estes, que consideravam seus deuses espíritos invisíveis e sem formas precisas, aprenderam com o budismo a erigir imagens e templos votivos. Proclamou-se inclusive que as duas religiões eram manifestações diferentes da mesma verdade, o que originou uma tendência sincretista.

Ambas religiões representam a religiosidade japonesa e os japoneses chegam a praticar os ritos de ambas tradições de acordo com a natureza da ocasião (por exemplo, preferem rituais xintoístas para rituais de nascimento e casamento e rituais budistas em eventos fúnebres).

Algumas das novas religiões japonesas tem forte influência xintoísta.

O xintoísmo não pretende converter, por isso sua expansão fora das ilhas japonesas limitou-se geralmente a descendentes de japoneses.





TAOISMO




Taoismo (ou daoísmo) é uma palavra empregada para traduzir dois termos chineses distintos, "Daojiao" (道教) (pinyin: Dàojiào; Wade-Giles: Tao-Chiao), que se refere aos "ensinamentos ou à religião do Dao", e "Daojia", que se refere à (道家) "escola do Tao (ou Dao)", a uma linha de pensamento da filosofia chinesa.

Assim, o termo taoismo pode referir-se a:
escola de pensamento filosófico chinês que se baseia nos textos do Tao Te Ching, atribuídos a Lao Tse, e nos escritos de Chuang Tse;

um movimento religioso chinês com origem em Zhang Daoling, no final da Dinastia Han, que se estrutura em seitas como a Zhengyi ("ortodoxa") e Quanzhen ("realidade completa");

manifestações da tradição religiosa chinesa, de caráter popular, que integram elementos da religião taoista, do confucionismo e do budismo.

O Tao do Taoismo

O ideograma Tao (ou Dao) (道) pode ser traduzido como "caminho", mas assume um significado mais abstrato para a religião e para a filosofia chinesa. Traduzido literalmente, significa "o ensinamento do Tao". No contexto taoista, Tao pode ser entendido como um caminho no espaço-tempo - a ordem na qual as coisas acontecem.

Como termo descritivo, pode se referir ao mundo real na história - algumas vezes nomeado como o "grande Tao" - ou, antecipadamente, como uma ordem que deve se manifestar - a ordem moral de Confúcio ou Lao Tsé ou Cristo etc.

Um tema no pensamento chinês primitivo é Tian-Dao ou caminho da natureza (também traduzido como "céu" e às vezes "Deus"). Corresponde aproximadamente à ordem das coisas de acordo com a lei natural. Tanto o "caminho da natureza" quanto o "grande caminho" inspiram o afastamento estereotípico taoista das doutrinas morais e normativas.

Assim, pensado como o processo pelo qual cada coisa se torna o que ela é (a "Mãe de todas as coisas"), parece difícil imaginar que temos que escolher entre quaisquer valores de seu conteúdo normativo - portanto pode ser visto como um príncípio eficiente de "vazio" que sustenta confiavelmente o funcionamento do universo.

Taoismo e confucionismo

O taoismo é uma tradição que, dialogando com seu tradicional contraste, o confucionismo, modelou a vida chinesa por mais de 2.000 anos. O taoismo enfatiza a espontaneidade ou liberdade da manipulação sócio-cultural pelas instituições, linguagem e práticas culturais.

Manifesta o anarquismo - defendendo essencialmente a ideia de que não precisamos de nenhuma orientação centralizada. Espécies naturais seguem caminhos apropriados a elas e os seres humanos são uma espécie natural. Seguimos todos por processos de aquisição de diferentes normas e orientações da sociedade e no entanto podemos viver em paz se não procuramos unificar todas estas formas naturais de ser.

Como o conceito confucionista de governo consiste em fazer todos seguirem o mesmo moral Tao, o taoismo representa de muitas maneiras a antítese do conceito confucionista referente a deveres morais, coesão social e responsabilidades governamentais, mesmo que o pensamento de Confúcio inclua valores taoistas e o inverso também ocorra, como se pode observar lendo os Anacletos.

Origens

Tradicionalmente, o taoismo é atribuído a três fontes principais:

a mais antiga, o mítico "Imperador Amarelo";

a mais famosa, o livro de aforismos místicos, o Dao De Jing (Tao Te Ching), supostamente escrito por Lao Zi (Lao Tse), que, segundo a tradição, foi um contemporâneo mais velho de Confúcio;

e a terceira, os trabalhos do filósofo Zhuang Zi (Chuang Tse).

Outros livros ampliaram o taoismo, como o True Classic of Perfect Emptiness, de Lie Zi; e a compilação Huainanzi. Além destes, o antigo I Ching, O Livro Das Mutações, é tido como uma fonte extra do taoismo, assim como práticas de adivinhação da China antiga.

Filosofia

Do Caminho, surge um (aquele que está consciente), de cuja consciência por sua vez surge o conceito de dois (Yin e Yang), dos quais o número três está implícito (céu, terra e humanidade); produzindo finalmente por extensão a totalidade do mundo como o conhecemos, as dez mil coisas, através da harmonia das Wuxing.

O Caminho, enquanto passa pelos cinco elementos do Wuxing, é também visto como circular, agindo sobre si mesmo através da mudança para simular um ciclo de vida e morte nas dez mil coisas do universo fenomênico.

Aja de acordo com a natureza e com sutileza, em lugar de força.

A perspectiva correta será encontrada pela atividade mental da pessoa, até chegar a uma fonte mais profunda que guie sua interação pessoal com o Universo (veja wu wei abaixo). O desejo obstrui a habilidade pessoal de entender O Caminho (veja também karma), moderar o desejo gera contentamento.

Os taoistas acreditam que, quando um desejo é satisfeito, outro, mais ambicioso, brota para substitui-lo. Em essência, a maioria dos taoistas sente que a vida deve ser apreciada como ela é, em lugar de forçá-la a ser o que não é. Idealmente, não se deve desejar nada, "nem mesmo não desejar".

Unidade: ao perceber que todas as coisas (inclusive nós mesmos) são interdependentes e constantemente redefinidas pela mudança das circunstâncias, passamos a ver todas as coisas como elas são e a nós mesmos como apenas uma parte do momento presente. Essa compreensão da unidade nos leva a uma apreciação dos fatos da vida e do nosso lugar neles como simples momentos miraculosos que "apenas são".

Dualismo, a oposição e combinação dos dois princípios básicos - Yin e Yang - do Universo, é uma grande parte da filosofia básica. Algumas das associações comuns com Yang e Yin, respectivamente, são: masculino e feminino, luz e sombra, ativo e passivo, movimento e quietude.

Os taoistas acreditam que nenhum dos dois é mais importante ou melhor que o outro, na verdade, nenhum pode existir sem o outro, porque eles são aspectos equiparados do todo. São em última análise uma distinção artificial baseada em nossa percepção das dez mil coisas, portanto é só nossa percepção delas que realmente muda.

 Wu Wei

Muito da essência do Tao está na arte do wu wei (agir pelo não-agir). No entanto, isso não significa "espere sentado que o mundo caia no seu colo". Essa filosofia descreve uma prática de se realizarem coisas através da ação mínima.

Pelo estudo da natureza da vida, você pode influenciar o mundo do modo mais fácil e menos disruptivo (usando a sutileza em vez da força). A prática de seguir a corrente em vez de ir contra ela é uma ilustração: uma pessoa progride muito mais não por lutar e se debater contra a água, mas permanecendo quieta e deixando o trabalho nas mãos da correnteza.

O Wu Wei funciona a partir do momento em que confiamos no design humano, perfeitamente ajustado para nosso lugar na natureza. Em outras palavras, confiando na nossa natureza em vez da nossa racionalidade, nós podemos encontrar contentamento sem uma vida de luta constante contra forças reais e imaginárias.

Uma pessoa pode aplicar essa técnica no ativismo social. Em vez de apelar para que outros tomem atitudes relacionadas a uma causa, seja qual for a sua importância ou validade, ela pratica uma vida de acordo com o que acredita, "não remando contra a maré". Ao deixar sua crença se manifestar em suas ações, está assumindo sua responsabilidade pelo movimento social em que acredita.

Tao Te Ching


O Tao Te Ching, ou'Daodejing, é amplamente considerado como o mais influente texto taoísta. É uma escritura de fundação de importância central no Taoísmo supostamente escrito por Lao Tzu em algum momento entre os séculos 3 e 4 BC.  

No entanto, a data exata que foi escrito é ainda objecto de debate: há aqueles que colocam em qualquer lugar do sexto século BC para o terceiro século aC. Ele tem sido usado como um texto ritual ao longo da história do taoísmo religioso.

comentaristas taoísta profundamente considerados os primeiros versos do Tao Te'Ching. Eles são amplamente discutidos, tanto acadêmicas e literatura mainstream. Uma interpretação comum é semelhante à observação Korzybski de que "o mapa não é o território". As linhas de abertura, com a tradução literal e comuns, são:

道 可 道, 非常 道. (Tao (caminho ou o caminho) pode ser dito, não da forma usual)

"O caminho que pode ser descrito não é o verdadeiro caminho."

名 可 名, 非常 名. (Os nomes podem ser citados, os nomes não usuais)

"O nome que pode ser nomeado não é o Nome constante." 'Tao, literalmente, significa "caminho" ou "caminho" e pode significar figuradamente "natureza essencial", "destino", "princípio", ou "caminho verdadeiro". O filosófico e religioso "Tao" é infinito, sem qualquer limitação. Um ponto de vista afirma que a abertura paradoxal destina-se a preparar o leitor para os ensinamentos sobre o Tao unteachable.

Tao Acredita-se que transcendente, indistinta e sem forma. Por isso, não pode ser nomeado ou categorizadas. Mesmo a palavra "Tao" pode ser considerada uma perigosa tentação de fazer'Tao limitação "nome". O Tao Te Ching não é tematicamente ordenados. No entanto, os principais temas do texto são repetidamente expresso em formulações variante, muitas vezes com apenas uma pequena diferença.

Os temas principais giram em torno da natureza do Tao e como alcançá-lo. Tao é dito ser inominável e realizar grandes coisas através de meios pequenos. Há um debate importante sobre o qual tradução Inglês do Tao Te Ching é o preferido, e cuja metodologia de tradução particular é melhor. Discussões e disputas sobre várias traduções do Tao Te Ching pode tornar-se amargo, envolvendo visões profundamente arraigados.

Antigos comentários sobre o Tao Te Ching são textos importantes em seu próprio direito. O'Heshang Gong comentário foi provavelmente escrito no século II dC, e, talvez, o mais antigo comentário, contém a edição do Tao Te Ching, que foi transmitido até os dias actuais. Outros comentários importantes incluem o Xiang'er, um dos textos mais importantes da Caminho do Mestre Celestial, e Wang Bi

Zhuangzi

O Zhuangzi(庄子) é tradicionalmente atribuído a um sábio taoísta do mesmo nome, mas isso foi recentemente contestada no meio acadêmico ocidental. Zhuangzi também aparece como um personagem na narrativa do livro. O Zhuangzi contém prosa, poesia, humor e disputa.

O livro é frequentemente visto como complexo e paradoxal quanto os argumentos e temas de discussão não são aqueles comuns à filosofia clássica ocidental, como a doutrina da nome de retificação (Zhengming) corretamente e fazer "isso / não-presente" distinções (shi / fei ).
 Entre o elenco de personagens das histórias do Zhuangzi é Laozi do Tao Te Ching, bem como a Confúcio.

Daozang

O Daozang (道 藏,Tesouro dos Tao) é por vezes referido como o cânon taoísta. Foi originalmente compilado durante a Jin, Tang e Canção Dinastia Song dinastias. A versão foi publicada hoje sobrevivem durante as dinastias
Ming dinastia. Schipper &  O Ming Daozang'inclui quase 1500 textos Seguindo o exemplo do [budista [Tripitaka]], é dividido em três dong'(洞 "cavernas", "gruta"). Eles estão organizados do mais alto "para" baixo ":

1.O Zhen("real" ou "verdade" 眞 gruta). Inclui o Escola Shangqing textos.

2.A'Xuan ("mistério" 玄) gruta. Inclui o Escola Lingbao escrituras.

3.O Shen("divino" 神) gruta. Inclui textos anteriores à Maoshan (茅山) revelações.

Daoshi geralmente não consultam publicado versões do Daozang, mas escolher individualmente, ou herdar, os textos incluídos no Daozang. Estes textos foram passados por gerações de professor para aluno.

A escola Shangqing tem uma tradição de se aproximar do Taoísmo através do estudo das escrituras. Acredita-se que recitando alguns textos muitas vezes um será recompensado com a imortalidade.

Outros textos

Enquanto o Tao Te Ching é mais conhecido, há muitos outros textos importantes no taoísmo tradicional. Taishang Ganying Pian("Tratado da Abençoado na resposta e Retribution") discute o pecado e [[ética] s], e tornou-se um intervalo de moralidade popular nos últimos séculos.

 Afirma que aqueles em harmonia com o Tao vai viver longa e frutífera vidas. Os ímpios, e seus descendentes, vai sofrer e ter encurtado vidas. Tanto aTaiping Jing("Escritura de Grande Paz") e o Baopuzi("Livro do Mestre, que conserva Simplicidade") contêm fórmulas alquímicas taoístas cedo que acreditava que poderia conduzir à imortalidade.

Além disso, o Huainanzi é uma compilação da escrita de oito acadêmicos de [dinastia Han] que combina taoísta, confucionista, e os conceitos legalistas, incluindo as teorias, tais como Yin-Yang e Cinco Fases. Patrono Liu An (c. 180-122 aC) foi governador do estado de Huainan e neto do fundador da dinastia Han, cujo discurso em sua corte favoreceu pensamento taoísta e que trouxe de filósofos, poetas e mestres de práticas esotéricas para a sua corte . Isso resultou na Huainanzi.

Religião

Embora Lao Zi nunca tenha pregado nenhuma religião no Tao Te King e se tenha sempre mantido no terreno filosófico e moral, cerca de mil anos depois da sua morte formou-se um corpo de doutrinas e de práticas religiosas e culturais que constituíram a religião taoista.

A religião taoista conserva apenas uns traços da filosofia de Lao Zi, com empréstimos de ideias e práticas culturais do budismo, com a introdução de vários deuses, deusas e génios, e uma mistura com algumas crenças preexistentes, como a teoria dos cinco elementos, a alquimia e o culto aos ancestrais.

Tentativas de alcançar maior longevidade eram um tema frequente na magia e alquimia taoistas, com vários feitiços e poções, ainda existentes, com esse propósito. Muitas versões antigas da medicina tradicional chinesa foram enraizadas no pensamento taoista e a medicina chinesa moderna, bem como as artes marciais chinesas, são ainda de várias formas baseadas em conceitos taoistas, como o Tao, o Qi e o balanço entre o Yin e o Yang.

Com o tempo, a absoluta liberdade dos seguidores do taoismo pareceu ameaçadora à autoridade de alguns governantes, que incentivaram o crescimento de seitas mais comprometidas com as tradições confucionistas.

Uma escola taoista foi formada ao fim da dinastia Han, por Zhang Daoling. Muitas seitas evoluíram através dos anos, mas a maioria traça suas origens a Zhan Daoling, e grande parte dos templos taoistas modernos pertence a uma ou outra dessas seitas. As escolas taoistas incorporam panteões inteiros de divindades, incluindo Lao Zi, Zhang Daoling, o Imperador Amarelo, o Imperador Jade, Lei Gong (O Deus do Trovão) e outros.

As duas maiores escolas taoistas da atualidade são a Seita Zhengyi (evoluída de uma seita fundada por Zhang Daoling) e o Taoísmo Quanzhen (fundado por Wang Chongyang).

 Influências no zen-budismo

O budismo Chan, que se desenvolveu como um escola distinta na China medieval, refletiu fortes influências da filosofia chinesa e, em particular, do taoismo. Com o tempo, o Chan acabou se estabelecendo na Coreia, onde recebeu o nome Seon. Havia monges que chegavam de outros países da Ásia para estudar o Chan e a escola foi se espalhando pelos países vizinhos.

No Vietname, recebeu o nome Thien e, no Japão, ficou conhecida como Zen. Através da história, essas escolas cresceram de maneira independente, tendo desenvolvido identidades próprias e características bastante diferentes umas das outras.

Na China, elementos do taoismo se combinaram com elementos do budismo e do confucionismo na forma do neoconfucionismo.

Taoismo fora da China

A filosofia taoista é praticada em várias formas, em outros países além da China. Kouk Sun Do, na Coreia, é uma dessas variações. A filosofia taoista encontrou muitos seguidores ao redor do mundo. Genghis Khan era simpático à filosofia taoista e, durante as primeiras décadas de dominação mongol, o taoismo viu um período de expansão, entre os séculos XIII e XIV. Devido a isso, muitas escolas taoistas tradicionais mantêm centros de ensino em vários países ao redor do mundo.

Taoismo no Brasil

No Brasil, existem vários ramos ligados ao taoismo, tanto o religioso (Taochiao) quanto o filosófico (Taochia). Uma das vertentes religiosas mais importantes é representada pela Sociedade Taoista do Brasil. A Sociedade Taoista do Brasil foi instituída no Rio de Janeiro/RJ, em 15 de Janeiro de 1991, com o objetivo de difundir o ensinamento do taoismo em todas as suas formas de expressão - religiosa, filosófica, científica e cultural - e contribuir para o aperfeiçoamento espiritual dos frequentadores.

O caminho taoista propõe a restauração do estado pleno de vida e consciência, chamado Tao. Para isso, utilizam-se vários meios, como as práticas que promovem a boa saúde física e mental, o estudo de clássicos escritos pelos grandes mestres do passado, os métodos místicos para a restauração da ordem interna e fundamentalmente a meditação, como caminho de autotransformação e elevação espiritual.

A Sociedade Taoista do Brasil foi fundada por Wu Jyh Cherng (1958-2004), sacerdote taoista Kao Kon Fa Shi (Alto Ofício, Mestre da Lei). Mestre Cherng escreveu diversos livros sobre artes taoistas e traduziu o Tao Te Ching, O Livro do Caminho e da Virtude, o Yi Jing (I-Ching), O Livro das Mutações, entre outros clássicos do taoismo.

Em Março de 2002, inaugurou a sede de São Paulo, um espaço adequado para a prática e estudo do taoismo, suas artes e sabedoria, onde se têm palestras abertas ao público, rituais, meditação e diversos cursos. Entre as actividades de São Paulo, enfatizam-se as práticas de meditação, Yi Jing (I Ching), Feng Shui, astrologia chinesa (Zi Wei Dou Shu), Tai Ji Quan (Tai Chi Chuan), Qi Gong (Chi Kun) e o atendimento de acupuntura e massagem.

Além dos grupos formalmente ligados ao taoísmo, também podem-se encontrar muitos ensinamentos taoístas sendo disseminados por escolas do budismo Mahayana chinês e também por religiões sincréticas como a Cao Dai, entre outras.



O GNOSTICISMO




O gnosticismo  (do grego Γνωστικισμóς (gnostikismós); de Γνωσις (gnosis): 'conhecimento') é um conjunto de correntes filosófico-religiosas sincréticas que chegaram a mimetizar-se com o cristianismo nos primeiros séculos de nossa era, vindo a ser declarado como um pensamento herético após uma etapa em que conheceu prestígio entre os intelectuais cristãos.

De facto, pode falar-se em um gnosticismo pagão e em um gnosticismo cristão, ainda que o pensamento gnóstico mais significativo tenha sido alcançado como uma vertente heterodoxa do cristianismo primitivo.

Portal do Ocultismo

Alguns autores fazem uma distinção entre "Gnosis" e "gnosticismo". A gnose é, sem dúvida, uma experiência baseada não em conceitos e preceitos, mas na sensibilidade do coração.

Gnosticismo, por outro lado, é a visão de mundo baseada na experiência de Gnose, que tem por origem etimológica o termo grego gnosis, que significa "conhecimento". Mas não um conhecimento racional, científico, filosófico, teórico e empírico (a "episteme" dos gregos), mas de caráter intuitivo e transcendental; Sabedoria.

É usada para designar um conhecimento profundo e superior do mundo e do homem, que dá sentido à vida humana, que a torna plena de significado porque permite o encontro do homem com sua essência eterna, centelha divina, maravilhosa e crística, pela via do coração.

É uma realidade vivente sempre ativa, que apenas é compreendida quando experimentada e vivenciada. Assim sendo jamais pode ser assimilada de forma abstrata, intelectual e discursiva.

O movimento originou-se provavelmente na Ásia Menor, difundindo-se da região do Irã à Gália, exercendo a sua maior influência sobre o cristianismo entre os anos de 135 e 200.

Tem como base elementos das filosofias pagãs que floresciam na Babilônia, Antigo Egipto, Síria e Grécia Antiga, combinando elementos da Astrologia e mistérios das religiões gregas como os do Elêusis, do Zoroastrismo, do Hermetismo, do Sufismo, do Judaísmo e do Cristianismo.

Num texto hermético lê-se que a gnosis da Mente é a "visão das coisas divinas". G.R.S.Mead acrescenta que "Gnosis não é conhecimento sobre alguma coisa, mas comunhão, co­nhecimento de Deus". Este é o grande objetivo, conhecer "Deus", a Reali­dade em nós.

Não é a crença, a fé ou o simples conhecimento o que importa. O fundamental é a comunhão interior, o religar da Mente individual com a Mente universal, a capacidade do homem "transcender os limites da dualidade que faz dele homem e tornar-se uma consciência divina".

A posse da Gnosis significa a habilidade para receber e compreender a revelação. O verdadeiro Gnóstico é aquele que conhece a revelação interior ou oculta desvelada e que também compreende a revelação exterior ou pública velada.

Ele não é alguém que descobriu a verdade a seu respeito por meio de sua própria desamparada reflexão, mas alguém para quem as manifestações do mundo interior são mostradas e tornaram-se inteligíveis.

O início da Perfeição é a Gnosis do Homem, porém a Gnosis de Deus é a Perfeição aperfeiçoada. "Aperfeiçoamento" é um termo técnico para o desenvolvimento na Gnosis, sendo o Gnóstico realizado conhecido como o "perfeito", "parfait".

A entrada na senda da Gnosis é chamada 'voltar para casa'. Como vimos, é um retorno, um virar as costas ao mundo, um arrependimento de toda natureza: "Devemos nos voltar para o velho, velho caminho".

"Somente o baptismo não liberta mas sim, a gnosis, o conhecimento interior de quem somos, o que nos tornamos, onde estamos, para onde vamos. O que é nascimento, o que é renascimento".

"Gnosis sobre quem éramos e no que nos tornamos; onde estávamos e onde viemos parar; para onde nos dirigimos e onde somos redimidos; o que é a geração, e o que é a regeneração". (Extratos de Theodotus)

Ingressar na Gnosis é um despertar do sono e da ignorância de Deus, da embriaguez do mundo para a temperança virtuosa. "Pois o mal [ilusão] do não conhecimento está inundando toda a terra e trazendo total ruína à alma aprisionada dentro do corpo, impedindo-a de navegar para os portos da salvação."

Doutrina Gnóstica

O pré-requisito essencial da filosofia gnóstica é o postulado da existência de uma "entidade imortal", que não é parte deste mundo, que pode ser chamado de Deus interno, Centelha divina, Crístico, divina essência etc, que existe em todos os homens e é a sua única parte imortal.

Os gnósticos consideram que o estado do homem neste mundo é "anti-natural", pois ele está submetido a todo tipo de sofrimentos. Para eles, é necessário que o homem se liberte deste sofrimento, e isto só pode ocorrer pelo conhecimento.

Os gnósticos, de um modo geral, acreditam que o Universo manifestado principia com emanações do Absoluto, seres finitos chamados de Æons que se reúnem no Pleroma. No princípio tudo era Uno com o Absoluto, então em um determinado momento, emanaram do Absoluto estes æons (éons), formando o pleroma.

O pleroma dos gnósticos é um plano arquetípico, abaixo do qual está o plano material, manifestado. Assim, o que antes era Uno e vivia no pleroma, se despedaça em partes. Este estado de infelicidade, pela descida no pleroma (e separação do Todo Uno), é o que ocasiona o sofrimento do homem neste mundo.

Um dos éons (Sophia) deu à luz o Demiurgo (artesão em grego), que criou o mundo material "mau", juntamente com todos os elementos orgânicos e inorgânicos que o constituem.

Os gnósticos ensinavam que a salvação vem por meio de um desses éons, geralmente apresentado como o décimo terceiro éon (identificado com o Cristo), distinto dos doze éons que regem o mundo decaído.

Segundo a doutrina, Cristo se esgueirou através dos poderes das trevas para transmitir o conhecimento secreto (gnosis) e libertar os espíritos da luz, cativos no mundo material terreno, para conduzi-los ao mundo espiritual mais elevado.

Segundo algumas linhas gnósticas, Cristo não veio em carne e nunca assumiu um corpo físico, nem foi sujeito à fraqueza e às emoções humanas, embora parecesse ser um homem, enquanto a principal linha de gnosticismo cristão, a Valentiniana defende a tese próxima do nestorianismo doutrina cristã, nascida no Século V, segundo a qual há em Jesus Cristo duas pessoas distintas, uma humana e outra divina, sendo Cristos (o ungido) o éon celestial que a um tempo se une a Jesus.

Alguns historiadores afirmam que o apóstolo João se refere a esse assunto quando enfatiza que "o Verbo se fez carne" (Jo l .14) e em sua primeira epístola que "todo o espírito que não confessa que Jesus Cristo veio em carne não é de Deus..." (l Jo 4.3). Os escritos joaninos são do final do primeiro século, quando nasceu o gnosticismo. No entanto, muitas comunidades gnósticas tinham o Evangelho de João em alta conta.

Dualismo e monismo

Normalmente, os sistemas gnósticos são vagamente descritos como sendo "dualistas" em natureza, o que significa que tem a visão do mundo constituído ou explicável como duas entidades fundamentais. Hans Jonas escreve: "A característica central do pensamento gnóstico é o radical dualismo que rege a relação de Deus e o mundo e, correspondentemente, do homem e o mundo. "

Dentro desta definição, que funcionam a gama do dualismo radical dos sistemas de maniqueísmo, do dualismo mitigado de alguns movimentos gnósticos; a evolução Valentiniana indiscutivelmente aborda uma forma de monismo, expresso em termos anteriormente utilizados de forma dualista.

O dualismo radical - ou dualismo absoluto que postula duas forças divinas co-iguais.O Maniqueísmo concebe dois reinos anteriormente coexistente da luz e da escuridão que se envolveu em conflito, devido à caótica ações deste último.

Posteriormente, alguns elementos da luz tornaram-se aprisionados dentro da escuridão, o propósito da criação material é para decretar o lento processo de extração destes elementos individuais, a fim de que o reino de luz prevalece sobre as trevas.

Esta mitologia dualista do zoroastrismo , no qual o espírito eterno Ahura Mazda é a oposição de sua antítese, Angra Mainyu , os dois estão envolvidos em uma luta cósmica, a conclusão de que será ver Ahura Mazda triunfante.

A criação no mito Mandeano, emanações progressivas do Supremo Ser de Luz, com cada emanação provocando uma corrupção progressiva que resulta no aparecimento eventual de Ptahil, o deus das trevas, que teve uma mão na criação de regras e passam a constituir o reino material.

Além disso, o pensamento gnóstico geral, comumente incluíam a crença de que o mundo material corresponde a algum tipo de intoxicação provocada pelo mal os poderes das trevas para manter elementos da luz aprisionada dentro dele, ou, literalmente, para mantê-los no escuro ", ou ignorantes, em um estado de distração bêbado.

Dualismo mitigado - quando um dos dois princípios é, de alguma forma inferiores aos outros. Tais movimentos gnósticos clássicos como o Sethiniano concebeu o mundo material como sendo criado por uma divindade menor do que o verdadeiro Deus, que era o objeto de sua devoção.

O mundo espiritual é concebido como sendo radicalmente diferente do mundo material, co-extensivo com o Deus verdadeiro, é a verdadeira casa de alguns membros iluminados da humanidade, portanto, estes sistemas foram expressivos de um sentimento agudo de alienação do mundo, e seu objetivo era permitir um resultado da alma, para escapar das limitações apresentadas pelo reino físico.

Monismo Qualificado - Elementos das versões do mito gnóstico Valentiniano sugerem para alguns que a sua compreensão do universo podem ter sido monista. Elaine Pagels afirma que " gnosticismo Valentiniano difere essencialmente do dualismo, enquanto, de acordo com SCHOEDEL "um elemento básico na interpretação dos Valentinianos é o reconhecimento de que elas são fundamentalmente monistas.

Nesses mitos, a malevolência do demiurgo é mitigada; sua criação de uma materialidade falha não é devido a qualquer falha moral da sua parte, mas devido a sua imperfeição em contraste com as entidades superiores de que ele desconhece.

Como tal, os Valentinianos já tem menos motivos para tratar com desprezo a realidade física do que um gnóstico Sethiniano

Para que o homem possa se libertar dos sofrimentos deste mundo, segundo os gnósticos, ele deve retornar ao Todo Uno, por ascensão ao pleroma, e isto só pode ser alcançado pelo Conhecimento Verdadeiro (representado pela Gnose). Este despertar só pode ocorrer se o homem se descobre, "conhecendo-se a si próprio".

Para o Gnosticismo existem três níveis de realização. No nível mais elevado estão aqueles que eram chamados eleitos, ainda que sem um sentido elitista de exclusão. Entre os gnósticos, eles eram conhecidos como pneumáticos, que significa espirituais.O grupo seguinte, os intermediários, são os psíquicos ou religiosos.

E, finalmente, os homens comuns, os muitos, na linguagem de Jesus, eram chamados pelos gnósticos, de ílicos ou materiais, pois aqueles que só estão voltados para os prazeres da vida material imediata, sem nenhum interesse pelo objetivo último da vida. Os textos gnósticos também tratam estes níveis como descendentes de Seth, Abel e Caim.

Assim, o ensinamento do Mestre Jesus, o Cristo - Aeon da Salvação, foi estruturado para atender as necessidades desses três grupos de pessoas.

Para o povo em geral, para aqueles que estão voltados exclusivamente para a vida neste mundo, a ênfase eram os ensinamentos sobre a ética e a vida diária.

Para os homens intermediários, que os gnósticos chamavam de religiosos, eram ensinamentos mais abrangentes sobre a vida e a prática espiritual, sendo esses ensinamentos encontrados nas escrituras cristãs.

E é interessante lembrar que esse grupo intermediário, eram aqueles que nesta vida, em função de suas decisões, determinações e postura de vida poderiam cair no grupo dos muitos, os materialistas, ou então, elevarem-se e entrar no grupo dos eleitos, daqueles que poderiam vir a ser salvos ou libertos.

E, finalmente, para o grupo dos assim chamados espirituais, os poucos, a tradição oferece ensinamentos sobre o caminho acelerado. O caminho acelerado, com suas naturais exigências de purificação e dedicação, só está aberto a poucos.

"As Escrituras Sagradas têm um sentido que é aparente à primeira vista, e um outro que a maioria dos homens não percebe.Porque são escritas em forma de certos Mistérios, e à imagem de coisas divinas.

A respeito do que há uma opinião em toda a Igreja, que toda a Lei em verdade é espiritual, porém que o sentido espiritual da Lei não é conhecido a todos, mas apenas aqueles que receberam a graça do Espírito Santo na palavra de sabedoria e conhecimento".

Assim, os primeiros cristãos sabiam que dois tipos de pessoas se achegariam ao cristianismo, um tipo sem o toque pneumático, e, portanto, incapaz de aproximar-se da salvação pelo conhecimento e pela sabedoria dos Mistérios, mas possuindo apenas capacidade de assimilar pela fé o lado superficial da Lei; o outro tipo, tocado pelo dom pneumático, pela centelha-espírito, que possuiria plena capacidade de assimilar os conhecimentos e a sabedoria dos Mistérios divinos e descer ao nível profundo e espiritual da Lei, podendo gozar de completa iluminação e redenção." Orígenes " De Principiis"

Grandes escolas gnósticas e seus textos

As escolas do Gnosticismo podem ser definidas de acordo com um dos sistemas de classificação como membros de duas grandes categorias. São elas as escolas "Orientais/Persas" e as escolas "Siríacas/Egípcias".

As escolas da primeira categoria possuem tendências dualistas mais pronunciadas, refletindo a forte influência das crenças do Zorastrismo Zurvanista persa. Já as escolas síriaco-egípcias e os movimentos que elas deram origem têm tipicamente uma visão mais Monista.

Notáveis exceções existem, incluindo movimentos relativamente modernos, que parecem ter incluído elementos de ambas as categorias, como os cátaros, os bogomilos e os carpocracianos.

Gnosticismo persa

As escolas persas, que apareceram na província da Babilônia e cujos escritos foram produzidos originalmente em dialetos aramaicos falados na região na época, representam o que se acredita serem as formas mais antigas do pensamento gnóstico.

Estes movimentos são considerados pela maioria como religiões por si sós e não seitas emanadas do Cristianismo ou do Judaísmo.

Mandeísmo é ainda praticado por pequenos grupos no sul do Iraque e na província iraniana do Khuzistão. O nome do grupo deriva do termo Mandā d-Heyyi, que significa "Conhecimento da Vida".

Embora a origem exacta deste movimento não seja conhecida, João Batista eventualmente se tornaria uma figura chave nesta religião, assim como ênfase no batismo se tornou parte do cerne de suas crenças. Assim como no Maniqueísmo, apesar de certos laços com o Cristianismo, os mandeanos não acreditam em Moisés, Jesus ou Maomé. Suas crenças e práticas também tem poucas sobreposições com as religiões fundadas por eles.

Uma quantidade significativa das Escrituras originais Mandeanas sobreviveram até a era moderna. O texto principal é conhecido como Genzā Rabbā e tem trechos identificados pelos estudiosos como tendo sido copiados já no século II dC. Existe também o Qolastā, ou "Livro Canônico de Oração" e o sidra ḏ-iahia, o "Livro de João Batista".

Maniqueísmo, que representa toda uma tradição religiosa e que agora está quase extinto, foi fundado pelo profeta Mani (216-276 dC).

Embora acredite-se que a maior parte das Escrituras dos maniqueístas tenha se perdido, a descoberta de uma série de documentos originais ajudou a lançar alguma luz sobre o assunto. Preservados agora em Colônia, Alemanha, o Codex Manichaicus Coloniensis contém principalmente informações biográficas sobre o profeta e alguns detalhes sobre seus ensinamentos.

Como disse Mani, "O Deus verdadeiro não tem nada a ver com o mundo material e o cosmos", e "É o Príncipe das Trevas que falou com Moisés, os judeus e seus sacerdotes. Portanto, cristãos, os judeus e os pagãos estão envolvidos no mesmo erro quando adora este Deus. Pois ele os leva para perdição através dos desejos que lhes ensinou".

Gnosticismo siríaco-egípcio

A escola siríaca-egípcia deriva muito de sua forma geral das influências platônicas. Tipicamente, ela apresenta a criação numa série de emanações de um fonte primal monádica, finalmente resultando na criação do universo material.

Como consequência, há uma tendência nestas escolas em ver o "mal" (ou a maldade) como a matéria, inferior à bondade, sem inspiração espiritual e sem bondade, ao invés de retratá-lo como uma força igual.

Podemos dizer que estas escolas gnósticas utilizar os termos "bem" e "mal" como sendo termos "relativos", pois se referem aos relativos apuros da existência humana, aprisionada entre estas realidades e confusa na sua orientação, com o "mal" indicando a distância extremada do princípio e fonte do "bem", sem necessariamente enfatizar uma negatividade inerente.

Como pode ser visto abaixo, muitos destes movimentos incluíram fontes relacionadas ao Cristianismo, com alguns inclusive se identificando como cristãos (ainda que de forma distintamente diferente das chamadas formas ortodoxas ou católica romana).

Escrituras siríaco-egípcias


A maioria da literatura nesta categoria nos é conhecida ou foi confirmada pela descoberta da Biblioteca de Nag Hammadi.

Obras Setianas, assim chamadas em homenagem ao terceiro filho de Adão e Eva, Sete (ou Seth), que eles acreditavam possuir e ser o disseminador da gnosis. As obras tipicamente setianas são:

O Apócrifo de João

O Apocalipse de Adão

A Hipóstase dos Arcontes, também conhecido por "A Realidade dos Regentes"

Trovão, Mente Perfeita

Protenóia trimórfica

Livro Sagrado do Grande Espírito Invisível também conhecido por "Evangelho Copta dos Egípcios"

Zostrianos

Alógenes

As Três estelas de Sete

O Evangelho de Judas

Obras Tomistas, assim chamadas por causa da escola de Tomé Apóstolo. Todos são pseudepígrafos. Os textos geralmente atribuídos a ela são:

Hino da Pérola, também conhecido como "Hino de Tomé Apóstolo Dídimo no país dos Indianos"

Atos de Tomé

O Evangelho de Tomé

Livro de Tomé o Adversário


Obras Valentianas são assim chamadas em referência ao Bispo e professor Valentim (ca. 153 dC). Ele desenvolveu uma complexa cosmologia fora da tradição setiana. Em certo ponto chegou a estar próximo de ser nomeado o Bispo de Roma, naquela que hoje é a Igreja Católica Romana. As obras geralmente atribuídas a eles estão listadas abaixo, sendo que os fragmentos que podem ser diretamente relacionadas a elas estão marcados com asterisco:

A Divina Palavra presente na Criança (Fragmento A) *

Sobre as Três Naturezas (Fragmento B) *

A Habilidade de falar de Adão (Fragmento C) *

Para Agathopous: O Sistema Digestivo de Jesus (Fragmento D) *

Aniquilação do Reino da Morte (Fragmento F) *

Sobre Amizade: A Fonte da Sabedoria Comum (Fragmento G) *

Epístola sobre Conexões Sentimentais (Fragmento H) *

Colheita de Verão *

Evangelho da Verdade *

A versão Ptolemaica do Mito Gnóstico

Prece do apóstolo Paulo

Epístola de Ptolomeu à Flora

Tratado sobre a Ressurreição, ou Epístola a Reginus.

Evangelho de Filipe

Obras Basilidianas, assim chamadas por causa do fundador da escola, Basilides (132–? dC). Quase todas as obras são conhecidas por nós principalmente através da crítica de um de seus oponentes, Ireneu de Lyon, no seu livro Adversus Haereses. Outros trechos são conhecidos através das obras de Clemente de Alexandria, principalmente a Stromata:

O Octeto das Entidades Subsistentes (Fragmento A)

A The Singularidade do Mundo (Fragmento B)

Ser Eleito Naturalmente requer Fé e Virtude (Fragmento C)

O Estado da Virtude (Fragmento D)

Os Eleitos Trascendem o Mundo (Fragmento E)

Reincarnação (Fragmento F)

O Sofrimento Humano e a Bondade da Providência (Fragmento G)

Pecados Perdoáveis (Fragmento H)

Gnosticismo posterior e grupos influenciados pelo Gnosticismo

Outras escolas e movimentos relacionados; estão apresentado em ordem cronológica.

A cruz circular, harmônica era um emblema utilizado pelos cátaros, uma seita medieval relacionada ao Gnosticismo.Simão Mago e Marcião de Sinope: ambos tinham tendências gnósticas, mas as ideias que eles apresentaram estavam ainda em formação; por isso, eles podem ser descritos como pseudo- ou proto-gnósticos.

Ambos desenvolveram um considerável conjunto de seguidores. O pupilo de Simão Mago, Menandro de Antióquia também pode ser incluído neste grupo. Marcião é popularmente identificado como gnóstico, porém a maior parte dos estudiosos não entende assim.

Cerinto (c. 100 dC), o fundador de uma escola herética com elementos gnósticos. Como gnóstico, Cerinto mostrou Cristo como um espírito celeste separado do homem Jesus e citou o Demiurgo como criador do mundo material.

Porém, ao contrário dos gnósticos, Cerinto ensinava os cristãos a observar a lei judaica; seu demiurgo era sagrado e não inferior; e acreditava na Segunda vinda de Cristo. Sua gnosis era um ensinamento secreto atribuído a um apóstolo. Alguns estudiosos acreditam que a Primeira Epístola de João foi escrita em resposta a Cerinto.

Os Ofitas, assim chamados por reverenciarem a serpente do Gênesis como um fonte de conhecimento.

Os Cainitas, que como o nome implica, veneravam Caim, assim como Esaú, Korah e os sodomitas. Há pouca evidência sobre a natureza deste grupo; porém, é possível inferir que eles acreditavam que indulgência no pecado era a chave para a salvação, pois dado que o corpo é intrinsecamente mau, é preciso denegri-lo com atitudes imorais (veja libertinismo). O nome 'cainita' não é utilizado aqui no sentido bíblico de "descendentes de Caim" (que segundo a Bíblia foram exterminados no Dilúvio).

Os Carpocracianos, uma seita libertina que acreditava unicamente no Evangelho dos Hebreus.

Os Borboritas, uma seita libertina gnóstica, que acredita-se ser uma derivação dos Nicolaítas

Os Paulicianos, um grupo adocionista, também acusado por fontes medievais como sendo gnóstica e quasi-maniqueísta. Eles floresceram entre 650 e 872 na Armênia e nas províncias (ou temas) orientais do Império Bizantino.

Os Bogomilos, a síntese (no sentido do sincretismo) entre o Paulicianismo Armênio e o movimento reformista da Igreja Ortodoxa Búlgara, que emergiu durante o Primeiro império búlgaro entre 927 e 970, e se espalhou pela Europa.

Os Cátaros (Cathari, Albigenses ou Albigensianos) são tipicamente vistos como imitadores do Gnosticismo. Se os cátaros possuíam ou não uma influência histórica direta do antigo Gnosticismo ainda é tema disputado, embora alguns acreditem que numa transferência de conhecimento dos bogomilos.

Embora as concepções básicas da cosmologia gnóstica possam ser encontradas nas crenças cátaras (principalmente a noção de um deus criador inferior, satânico). Catarismo é a religião do Espírito (do Paracleto). Eles se separaram dos outros gnósticos deixando de lado os éons, os arcontes, os diagramas e os números cabalísticos.

Conceitos e termos importantes

Note que o texto a seguir é formado por resumos das várias interpretações gnósticas existentes. Os papéis de alguns seres mais familiares, como Jesus Cristo, Sophia e o Demiurgo geralmente compartilham os temais centrais entre os vários sistemas, mas pode haver algumas diferentes funções ou identidades atribuídos a eles em cada uma.

Æon

Em muitos sistemas gnósticos, os aeons são várias emanações de um deus superior, que também é conhecido por nomes como Mônada, Aion teleos (grego: "O Perfeito Aeon"), Bythos (grego: Βυθος - 'profundidade') e muitos outros.

Deste ser inicial, também um Aeon, uma série de diferentes emanações ocorreram, começando em alguns textos gnósticos com o hermafrodita Barbelo de quem sucessivos pares de Aeons emanam, frequentemente em pares masculino-feminino chamados de sizígias; o número destes pares varia de texto para texto, embora alguns identifiquem seu número como sendo trinta.

Os Aeons como uma "totalidade" constituem o Pleroma, a "região de luz". As regiões mais baixas do Pleroma estão mais perto da escuridão, ou seja, do mundo material.

Dois dos Aeons mais frequentemente emparelhados são Jesus e Sophia (em grego: sabedoria). Ela se refere a Jesus como seu 'consorte' em Exposição Valentiana. Sophia, emanando sem o seu parceiro resulta na criação do Demiurgo (em grego: "construtor público") também chamado de Yaldabaoth (ou variações) em alguns textos.

Esta criatura está escondida fora do Pleroma em isolamento, e acreditando-se sozinha, ela cria a matéria e uma horda de co-atores, referidos como Arcontes. O Demiurgo é reponsável pela criação da humanidade, pois assim ele pode aprisionar as fagulhas do Pleroma roubadas de Sophia em corpos humanos.

 Em resposta, o Mônada emana dois Aeons salvadores, 'Cristo e o Espírito Santo; Cristo então se incorpora na forma de Jesus para poder ensinar aos homens como alcançar a gnosis, pela qual eles poderão retornar ao Pleroma.

Arconte

No final da antiguidade, algumas variantes do Gnosticismo utilizaram o termo "Arconte" para se referir aos diversos servos do Demiurgo. Neste contexto, eles podem ser entendidos como tendo o papel dos anjos e demônios do Antigo Testamento.

De acordo com Contra Celso, de Orígenes, a seita dos Ofitas (veja acima Gnosticismo posterior e grupos influenciados pelo Gnosticismo) propuseram a existência de sete arcontes, começando com o próprio Yaldabaoth, que criou os próximos seis: Iao, Sabaoth, Adonaios, Elaios, Astaphaios e Horaios.

Assim como o Chronos mitráico e o Narasimha védico (uma forma de Vishnu), Yaldabaoth tem a cabeça de um leão (embora tenha o corpo de uma serpente de acordo com o Apócrifo de João).


Abraxas / Abrasax



Gravura de uma pedra de Abraxas.

Os gnósticos egípcios seguidores de Basilides se referiam frequentemente à uma figura chamada Abraxas, que estava no topo dos 265 seres espirituais (segundo Ireneu, Contra Heresias, I.24); não está claro como interpretar o uso que Ireneu faz do termo 'Arconte', que pode significar apenas 'governante' neste contexto. Nem o papel e nem o significado de Abraxas para esta seita estão claros.

Textos encontrados na Biblioteca de Nag Hammadi, como o Livro Sagrado do Grande Espírito Invisível, se referem a Abrasax como Aeon morando com Sophia e os outros Aeons na Totalidade Espiritual, sob a luz do luminar Eleleth.

Demiurgo



Uma divindade com face de leão encontrada numa gema gnóstica em L'antiquité expliquée et représentée en figures de Bernard de Montfaucon pode ser uma representação do Demiurgo; porém, veja também Chronos.

O termo Demiurgo deriva da forma latinizada do termo grego dēmiourgos (δημιουργός), significando literalmente "servidor público ou trabalhador habilidoso" e se refere à uma entidade responsável pela criação do universo e de todo o aspecto físico da humanidade.

O termo dēmiourgos ocorre em diversas outras religiões e sistemas filosóficos, principalmente o Platonismo. Julgamentos morais sobre o demiurgo variam de grupo para grupo dentro da grande categoria do Gnosticismo - estes julgamentos geralmente correspondem ao julgamento de cada grupo sobre o status da materialidade como sendo intrinsecamente má, ou meramente falha e tão boa quanto a passiva matéria que a consitui permite.

Como Platão faz, O Gnosticismo apresenta uma distinção entre uma realidade supranatural, incognoscível e a materialidade sensível, da qual o Demiurgo é o criador.

Porém, em contraste com Platão, os diversos sistemas gnósticos apresentam o demiurgo como um antagonista do Deus Supremo: seu ato de criação, seja ele inconsciente e uma imitação fundamentalmente falha do modelo divino (veja o Mito da Caverna), ou formado com a intenção maligna de aprisionar aspectos do divino "na" materialidade.

Portanto, nestes sistemas, o Demiurgo age como uma solução para o problema do mal. No Apócrifo de João, o Demiurgo - ali chamado de Yaldabaoth - se proclama como Deus:

“ Agora o arconte que é fraco tem três nomes. O primeiro nome é Yaldabaoth, o segundo é Saclas e o terceiro é Samael. E ele é ímpio em sua arrogância, que está nele. Pois ele disse: 'Eu sou Deus e não há outro Deus além de mim', pois ele é ignorante de sua força, do lugar de onde veio. ”

— Apócrifo de João

"Samael", na tradição judaico-cristã, se refere ao anjo mau da morte e corresponde ao demônio cristão de mesmo nome, atrás apenas de Satã[carece de fontes?]. Literalmente, pode significar "deus-cego" ou "deus dos cegos" em aramaico (siríaco sæmʕa-ʔel); o outro título, Saclas, aramaico para "tolo" (siríaco sækla "o tolo").

No mito de Sophia, sua mãe, Sophia, também um aspecto parcial do Pleroma (ou "Totalidade"), desejava emanar de si algo sem a autoridade do Espírito Supremo. Neste ato abortivo e imperfeito, ela deu à luz ao monstruoso Demiurgo. Envergonhada com seu ato, ela o envolveu numa nuvem com um trono no meio para que os demais Aeons não percebessem.

 O Demiurgo então, isolado, sem ver sua mãe e ninguém mais, concluiu que era o único que existia e, ignorante, criou o mundo material, a humanidade e uma hierarquia de "poderes" (Arcontes) para governá-lo.

Os mitos gnósticos descrevendo estes eventos são cheios de nuances intrincadas retratando a declinação de aspectos do divino até a forma humana; este processo acontece através do trabalho do Demiurgo que, tendo roubado um pouco do poder de sua mãe, passa a trabalhar na criação de uma imitação inconsciente do reino superior do Pleroma (como sombras das imagens).

Assim, o poder de Sophia (as "fagulhas" ou "sopro" divino)fica aprisionado dentro das formas materiais da humanidade, também presa dentro do mundo material: o objetivo de todos os movimentos gnósticos era tipicamente acordar esta fagulha, o que permitiria o retorno do indivíduo à realidade superior, não material onde estava a fonte primal.

Alguns filósofos gnósticos identificam o Demiurgo com Yahweh, o Deus do Antigo Testamento, em oposição e contraste ao Deus do Novo Testamento. Ainda outros o igualam com Satã. Os cátaros aparentemente herdaram sua idéia de Satã como o criador do mundo maligno diretamente ou indiretamente do Gnosticismo.

Gnosis (ou Gnose)

Gnosis vem da palavra grega para "conhecimento", gnosis (γνῶσις). Porém, gnosis em si se refere a uma forma muito especial de conhecimento, derivada tanto do significado exato do termo grego quanto seu uso na filosofia de Platão.

O grego antigo era capaz de discernir entre diversas formas diferentes de "conhecer".

Essas formas podem ser descritas em língua portuguesa como sendo conhecimento proposicional, indicativo de um conhecimento adquirido "indiretamente" através de reportes de outros ou por inferência (como em "Eu sei que Lisboa está em Portugal"), e o conhecimento conhecimento empírico, adquirido através de "participação direta" (como em "Eu sei que Lisboa está em Portugal pois estive lá").

Gnosis (γνῶσις) se refere ao conhecimento do segundo tipo. Portanto, em um contexto religioso, ser 'gnóstico' deve ser entendido como confiar não em conhecimento no sentido geral, mas como sendo especialmente receptivo às experiências místicas ou esotéricas de participação direta com o divino.

De facto, na maior parte dos sistemas gnósticos, a causa suficiente para salvação é este "conhecimento do" ('ser familiar com') divino. Isto é geralmente identificado com o processo de conhecimento interno ou de auto-exploração, comparável com o que foi encorajado por Plotino.

Porém, como se pode ver, o termo 'gnóstico' tem um uso precendente em diversas tradições filosóficas que precisa também ser levado em consideração para que seja possível entender as implicações sutis que este epíteto tem para diversos grupos religiosos antigos.

Mônada

Em muitos sistemas gnósticos (e heresiológicos), o Ser Supremo é conhecido como Mônade, o Uno, o Absoluto Aiōn teleos (O Perfeito Aeon, αἰών τέλεος), Bythos (Profundidade, Βυθός), Proarchē (Antes do Início, προαρχή, Hē Archē (O Início, ἡ ἀρχή) e Pai inefável. O Uno é a fonte primal do Pleroma, a região de luz. As várias emanações do Uno são chamados "Aeons".

A cosmogonia setiana como está no famoso Apócrifo de João (ou Livro Secreto de João) descreve um deus desconhecido, muito similar à Teologia negativa ortodoxa, embora muito diferente dos ensinamentos do credo ortodoxo de que existe um deus assim que também seja o criador do céu e da terra.

Teólogos ortodoxos, quando descrevendo a natureza do deus criador associado aos textos bíblicos, muitas vezes tentam defini-lo através de uma série de afirmações explícitas e positivas (cataphrasis), por si sós universais, e que associadas ao divino se tornam superlativas: ele é onisciente, onipotente e verdadeiramente benevolente.

Já na concepção setiana do deus trascendente e escondido descrita no texto, ele é definido, por contraste, através da teologia negativa (apophasis): ele é imóvel, invisível, intangível e inefável. Geralmente, 'ele' é visto como uma sendo hermafrodita, um símbolo potente para um ser, pois ele é o que 'tudo contém'.

Uma abordagem apofásica na discussão da Divindade pode ser encontrada por todo o Gnosticismo, nos Vedas, nas teologias de Platão e Aristóteles e em algumas fontes judaicas.

PLEROMA

Pleroma (em grego: πληρωμα geralmente se refere à totalidade dos poderes de deus. O termino significa "plenitude" e é usado em vários contextos teológicos cristãos: tanto gnósticos em geral, como também no cristianismo (como em «Pois nele habita corporalmente toda a plenitude da Divindade» (Colossenses 2:9)[.

O Pleroma celeste é o centro da vida divina, uma região de luz "acima" (o termo não deve ser entendido espacialmente) do nosso mundo, ocupado por seres espirituais como os Aeons e, às vezes, por arcontes.

Jesus é interpretado como sendo um aeon intermediário que foi enviado do Pleroma e cuja ajuda seria fundamental para que a humanidade recupere o conhecimento perdido (ou esquecido) das suas origens divinas. O termo é, portanto, central na cosmologia gnóstica.

Pleroma também é utilizado na língua grega comum e é utilizado pela Igreja Ortodoxa Grega na sua forma geral pois a palavra aparece em Colossenses. Proponentes da visão que Paulo seria na verdade gnóstico, como Elaine Pagels da Universidade de Princeton, enxergam a referência em Colossenses como algo a ser interpretado no sentido gnóstico.

Sophia

Sophia (em grego: Σοφία) é aquilo que detém o "sábio" (em grego: σοφός; "sofós"). Na tradição gnóstica, Sophia é uma figura feminina, análoga à alma humana e simultaneamente um dos aspectos femininos de Deus. Os gnósticos afirmam que ela é a sizígia de Jesus (veja a Noiva de Cristo) e o Espírito Santo da Trindade.

Ocasionalmente é referenciada pelo equivalente hebreu Achamōth (em grego: Ἀχαμώθ) e como Prouneikos (em grego: Προύνικος, "A Libidinosa"). Nos textos da Biblioteca de Nag Hammadi, Sophia é o mais baixo dos Aeons ou a expressão antrópica da emanação da luz de Deus.


Cristãos Gnósticos

Nos séculos I e II o gnosticismo produziu manifestações dentro da cristandade, sobretudo no Egito, onde se destacaram líderes como Carpócrates, Basílides, Isidoro e Valentim, este último fundador de uma importante escola em Roma.

Os Cristãos Gnósticos constituíram, nos primeiros anos dessa nossa era, uma comunidade fechada, iniciática, que guardou os aspectos esotéricos dos evangelhos, principalmente das parábolas do Mestre Jesus, o Cristo, apresentando um cristianismo muito mais profundo e filosófico do que daqueles cristãos que ficaram conhecidos como a ortodoxia.

Dentre os grupos mais activos nos dois primeiros séculos de nossa era destacam-se os naasenos (palavra em aramaico com o mesmo significado de ofitas, de origem grega), perates, sethianos (de orientação judaica) docéticos (que propunham que a natureza exterior do Cristo era ilusória), carpocráticos, basilidianos e valentinianos.

Com o passar do tempo, os herdeiros da tradição gnóstica e maniqueísta foram mudando de nome, podemos indicar o aparecimento dos seguintes grupos: entre os séculos III e IX: Euchites, Magistri Comacini, Artífices Dionisianos, Nestorianos e Eutychianos; no século X: Paulicianos e Bogomilos; no século XI: Cátharos, Patarini, Cavaleiros de Rodes, Cavaleiros de Malta, Místicos Escolásticos; no século XII: Albigenses, Cavaleiros Templários, Hermetistas; no século XIII: a Fraternidade dos Winklers, os Beghards e Beguinen, os Irmãos do Livre Espírito, os Lollards e os Trovadores; no século XIV: os Hesychastas, os Amigos de Deus, os Rosa-cruzes e os Fraticelli; no século XV: os Fraters Lucis, a Academia Platônica, a Sociedade Alquímica, a Sociedade da Trolha e os Irmãos da Boêmia (Unitas Fratrum); no século XVI: a Ordem de Cristo (derivada dos Templários), os Filósofos do Fogo, a Militia Crucífera Evangélica e os Ministérios dos Mestres Herméticos; no século XVII: os Irmãos Asiáticos (Irmãos Iniciados de São João Evangelista da Ásia), a Academia di Secreti e os Quietistas; no século XVIII: os Martinistas; no século XIX: a Sociedade Teosófica.

Os Paulicianos formavam um grupo gnóstico ativo no Império Romano. Se declaravam contra todas hierarquias que exerciam seu poder para combater a iluminação interior. Até o século XI, os paulicianos foram mortos pela igreja romana, assim como o Maniqueísmo antes deles.

Mas o gnosticismo sobreviveu, sua luz e força continuaram a irradiar com os bogomilos...A herança Gnóstica dos séculos XII e XIII, foram transmitidas aos Cátaros, que também foram perseguidos e mortos pela igreja romana. Na Idade Média, o gnosticismo manifestou-se na Ordem dos Templários, foi revivificada pela Rosa-cruz ,pelas mãos de Johannes Valentinus Andreae, mantiveram ligações com a Maçonaria,com a Teosofia e com o Martinismo.

Todos testemunhando o Cristianismo Interior, descrevendo o caminho de retorno a Deus, que foi aberto pelo seu filho, Mestre Jesus, o Cristo.

Fontes

Pouco material chegou até os dias de hoje, a maioria dos personagens e suas doutrinas só puderam ser conhecidos por meio dos críticos do gnosticismo. A maior polêmica contra os gnósticos apareceu no período patrístico, com os escritos apologéticos de Irineu(130-200), Tertuliano (160-225) e Hipólito (170-236).

Por isso a descoberta da Biblioteca de Nag Hammadi,em 1945, foi de suma importância, visto que seu conteúdo é eminentemente gnóstico. O achado impulsionou as pesquisas sobre o assunto na segunda metade do século XX.

 Estes manuscritos totalizavam cinquenta e dois textos, em treze códices de papiro, escritos em copta. Entre as obras aí guardadas encontravam-se diversos tratados gnósticos, três obras pertencentes ao Corpus Hermeticum e uma tradução parcial da República de Platão. Parte deles conhecidos também como Evangelhos gnósticos

Os Manuscritos Pistis Sophia,"Piste Sophiea Cotice" ou "Códice Askew", atribuidos a Valentim foi adquirido do médico e colecionador de manuscritos antigos Dr. Askew pelo Museu Britânico em 1795 , datam de 250–300 AD, relatam os ensinamentos Gnósticos do Mestre Jesus, o Cristo transfigurado aos apóstolos.

Até a descoberta da biblioteca de Nag Hammadi em 1945, o Códice Askew era um dos três códices que continha quase todos os escritos gnósticos que tinham sobrevivido, sendo os dois outros códices o Códice Bruce e o Códice de Berlim.

Mais recentemente um outro documento gnóstico foi encontrado, gerando diferentes especulações sobre o verdadeiro relacionamento de Jesus Cristo com o seu discípulo Judas, este documento é o Evangelho de Judas que estava desaparecido por mais de 1700 anos, tendo sido encontrado finalmente no Egito.

Elaine Pagels professora de religião na Universidade de Princeton e Ph.D. da Universidade de Harvard.Em Harvard ela fez parte de um grupo que estudou os rolos de Nag Hammadi, dessa experiência resultou a base para o seu primeiro livro Os Evangelhos Gnósticos,

Esse livro é uma introdução aos textos de Nag Hammadi para o público leigo e é, desde o seu lançamento, um best-seller. Nos EUA, ganhou os prêmios National Book Critics Circle Award e National Book Award e foi escolhido pela Modern Library como um dos 100 melhores livros do século XX.

George Robert Stowe Mead (1863 - 1933).Com formação em línguas e filosofia por Oxford, estudioso altamente intuitivo e perspicaz, deve ser considerado como um pioneiro de primeira ordem no domínio dos escritos gnósticos e estudos herméticos, foi autor, editor, tradutor e um influente membro da Sociedade Theosophica.

Seu maior mérito teria sido a sua capacidade de discernir o significado interior e espiritual dos dos escritos, capacidade esta reconhecida por C.G.Jung que fez uma viagem especial a Londres no último período de vida de Mead, para lhe agradecer por seu trabalho brilhante e pioneiro de traduzir e comentar as escrituras gnósticas.

Bentley Layton(1941) é Professor de Estudos Religiosos e Professor do Oriente Próximo Línguas e Civilizações (copta) na Universidade de Yale (desde 1983).Autoridade reconhecida internacionalmente, em literatura gnóstica. Membro do projeto da UNESCO, CAIRO, que publicou a Biblioteca de Nag Hammadi.

Formado em Harvard, "Redescoberta tardia do gnosticismo", foi o título da conferência internacional que ele apresentou na Universidade de Yale em 1980. Seus interesses encontram-se na história do cristianismo desde suas origens até o surgimento do Islã, os estudos gnósticos e copta . Seu livro mais acessível é "As Escrituras Gnósticas", que apresenta parte da literatura gnóstica enigmáticos do cristianismo.

Ele apresenta sua seleção de escrituras gnósticas, os escritos de Valentino e seus seguidores, e os escritos relacionados que exibem tendências gnósticas no contexto mais amplo de cristianismo primitivo e do judaísmo helenístico, com introduções generosas e anotações abundantes.

Para os especialistas, a gramática copta de Layton é um texto padrão. Ele catalogou todos os manuscritos coptas na Biblioteca Britânica. Ele é membro do conselho da Harvard Theological Review eo Journal of Studies copta.

James M. Robinson (nascido em 1924) é professor Emérito de religião, na Universidade de Claremont, Califórnia. É o mais proeminente erudito do século 20, da biblioteca de Nag Hammadi.

Stephan A. Hoeller (1931 - ) Ph.D. em filosofia da religião da Universidade de Innsbruck em Áustria, escritor, erudito e líder religioso.

Dr. Marvin Meyer (Ph.D., Claremont Graduate University, M. Div. Calvin Theological Seminary) é professor de Bíblia e Estudos Cristãos e co-presidente do Departamento de Estudos Religiosos, Chapman University. Ele também é diretor do o Albert Schweitzer Chapman University Institute.

Ele é diretor do Projeto dos Textos Mágicos Coptas do Instituto de Antiguidade e Cristianismo, Claremont Graduate University, membro do Seminário Jesus, e um ex-presidente da Society of Biblical Literature (Pacific Coast). Dr. Meyer é o autor de numerosos livros e artigos sobre a civilização greco-romana e religião cristã na antiguidade e da antiguidade tardia, e no Albert Schweitzer é ética de reverência pela vida.

Kurt Rudolph (03 de Abril de 1929) Pesquisador do gnosticismo e Mandeismo.Nascido em Dresden Rudolph estudou teologia protestante, religião , história semitas nas universidades de Greifswald e de Leipzig.

Posteriormente, durante seis anos, ele foi assistente de pesquisa , enquanto ele trabalhava em paralelo para o doutorado em teologia e, assim como a história religiosa. Em 1961 ele recebeu sua habilitação em história da religião e religião comparada.

Durante seu trabalho na Universidade de Leipzig , Chicago e Marburg e Santa Barbara(University of California), ele adquiriu uma reputação internacional como um conhecedor do gnosticismo e maniqueísmo.Além disso, ele também ocupou-se com o Islão e questões metodológicas em estudos religiosos.

Jakob Böhme ou Jacob Boehme, (Alt Seidenberg, 1575 — Görlitz, 17 de Novembro de 1624) foi filósofo e místico cristão alemão,as obras que escreveu são o maior monumento de conhecimentos teogônicos (concernentes ao surgimento dos primeiros princípios em Deus) e cosmogônicos (concernentes à criação do Universo e das criaturas) da história do cristianismo.

Platão Πλάτων, Plátōn. (Atenas, 428/427– Atenas, 348/347 a.C.) foi um filósofo e matemático do período clássico da Grécia Antiga, autor de diversos diálogos filosóficos e fundador da Academia em Atenas, a primeira instituição de educação superior do mundo ocidental. Juntamente com seu mentor, Sócrates, e seu pupilo, Aristóteles, Platão ajudou a construir os alicerces da filosofia natural, da ciência e da filosofia ocidental.

Plotino(ca. 205 - 270) O pai do neoplatonismo, natural de Licopólis, Egito, foi discípulo de Amônio Sacas e mestre de Porfírio. A influência de Plotino e dos neoplatônicos sobre o pensamento cristão, islâmico e judaico, bem como sobre os pensadores de proa do Renascimento, foi enorme.

Foram direta ou indiretamente influenciados por ele, Dionísio Pseudo-Areopagita, Alberto Magno, Dante Alighieri, Mestre Eckhart, João da Cruz, Marsílio Ficino, Pico de la Mirandola, Giordano Bruno, Avicena, Ibn Gabirol, Espinosa, Leibniz.

Hermes Trismegistus; em grego Ερμης ο Τρισμεγιστος, "Hermes, o três vezes grande" é o nome dado pelos neoplatônicos, místicos e alquimistas ao deus egípcio Thoth, identificado com o deus grego Hermes. Ambos eram os deuses da escrita e da magia nas respectivas culturas.

Hermes era o autor de um conjunto de textos sagrados, "herméticos", contendo ensinamentos sobre artes, ciências e religião e filosofia: O Corpus Hermeticum , datado entre o século I ao século III, representou a fonte de inspiração do pensamento hermético e neoplatônico renascentista.

Na época acreditava-se que o texto remontasse à antiguidade egípcia, anterior a Moisés e que nele estivesse contido também o prenúncio do cristianismo. Autor também do Livro dos Mortos, e do mais famoso texto alquímico a "Tábua de Esmeralda".

Huberto Rohden, São Ludgero, 31 de Dezembro de 1893 foi um filósofo, educador e teólogo catarinense, radicado em São Paulo. escreveu mais de 100 obras (ao final da vida, condensadas em 65 livros), onde franqueou leitura ecumênica de temáticas espirituais e abordagem espiritualista de questões pertinentes à Pedagogia, Ciência e Filosofia, enfatizando o autoconhecimento, auto-educação e a auto-realização.Lecionou na Universidade de Princeton, American University, de Washington D.C.(EUA)

Raul Branco Autor, tradutor é membro da Sociedade Teosófica, economista, mora em Brasília e dedica-se ao estudo da tradição cristã e do gnosticismo. Tradutor para o português de Pistis Sophia - G.R.S. Mead.

Carl Gustav Jung, nasceu a 26 de Julho de 1875, em Kresswil, Basiléia, na Suíça, no seio de uma família voltada para a religião. Seu pai e vários outros parentes eram pastores luteranos, o que explica, em parte, desde a mais tenra idade, o interesse do jovem Carl por filosofia e questões espirituais e o pelo papel da religião no processo de maturação psíquica das pessoas, povos e civilizações.

Criança bastante sensível e introspectiva, desde cedo demonstrou uma inteligência e uma capacidade intelectual notável. Gnóstico assumido, ficou célebre a resposta que Jung deu, em 1959, a um entrevistador da BBC que lhe perguntou: "O senhor acredita em Deus?" A resposta foi: "Não tenho necessidade de crer em Deus.

Eu o conheço" Escreveu o livro Os Sete Sermões aos Mortos, foi amigo, admirador e colaborador de G.R.S.Mead, tradutor dos Manuscritos da Nag Hammadi, particularmente do Códice Jung, trabalho patrocinado pela Fundação Jung.

Fernando Pessoa, 13 de Junho de 1888 nascia em Lisboa, gnóstico possuía ligações com a Tradição, com destaque para a Maçonaria e a Rosa-Cruz, havendo inclusive defendido publicamente as organizações iniciáticas, no Diário de Lisboa de 4 de Fevereiro de 1935, contra ataques por parte da ditadura do Estado Novo. O seu poema hermético mais conhecido e apreciado entre os estudantes de esoterismo intitula-se "No Túmulo de Christian Rosenkreutz". Deixou escrito o Livro Rosa Cruz.

Paralelos com religiões orientais

O gnosticismo tem alguns elementos em comum com o sufismo, o budismo, o helenismo, o hermetismo, o zoroastrismo e o hinduísmo.

Gnosticismo e psicologia

No século XX, Carl Gustav Jung pesquisou profundamente as doutrinas gnósticas, inclusive ajudando no trabalho de organização da Biblioteca de Nag Hammadi, e fez uma ligação entre os mitos gnósticos e os arquétipos do inconsciente coletivo.

Escreveu o livro "Sete sermões aos mortos", sob o pseudônimo de Basilides de Alexandria, onde coloca a sua visão gnóstica em sete textos no formato dos evangelhos.